Sentia-lhe
o sorriso irónico, os óculos escuros, não permitiam uma melhor leitura, só via
aquele trejeito nos lábios. Custava perceber a razão, se nunca faláramos, pelo
menos, que eu tivesse lembrança. Se nunca lhe escutara voz, o que a levava, ao
cruzar comigo, nos passeios da rua a expressa-se daquela forma. Um dia cruzámo-nos,
bem perto, quase sentindo a respiração, mas não mais do que isso, e permitiu
aperceber-me dum rosto, sem óculos e sentir o olhar, brilhante, de um verde-mar.
Não posso adivinhar, qual seria a minha expressão naquele momento, embora tenha
de reconhecer a dimensão física da sua figura, sobressaindo em relação ao
restante dos que ali circulavam, é possível que o pousar dos meus olhos, nos
seus olhos, me tenham traído. Talvez o meu olhar despido de preconceitos, tenha
evidenciado mais do que devia. Tudo ficou por aí. Não mais a vi pela vizinhança,
foi um fogo-fátuo. Lembrei-me, porque a primavera está a chegar e tudo volta a
florir. Quem sabe o que poderá acontecer?
dc