sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

A MEMÓRIA DE TI



Não coloco aqui o teu retrato encabeçando o texto, sim a flor que te dá o nome e que talvez melhor te explique. Tem o branco da paz que transmitias; tem o amarelo sol, calor do teu aconchego; tem as múltiplas pétalas da tua partilha.

Partiste Margarida, e como mulher terra à terra que sempre foste, não acreditas que irás para o paraíso, nem que farás uma viagem para o desconhecido, mas a nós que cá ficamos sem a tua presença e, com mágoa da tua partida, é-nos conveniente acreditar que assim seja. Até porque achamos que merecias pelo teu exemplo de ser humano.

Durante todo a tua existência foste um exemplo como trabalhadora, como esposa, mãe, avó e sogra. Foste uma revolucionária, como a maioria dos alentejanos, activa e militante comunista trabalhando e participando enquanto as forças, e a tua atenção para com o teu filho, com deficiência, tu permitiu.

Quando te conheci e foi amor à “primeira vista”. Dizer isto de uma sogra, para alguns, é quase blasfémia, no entanto é a verdade. Quase quarenta anos passados desde que falamos a primeira vez, sempre existiu sintonia entre nós, como se duas almas nascidas do mesmo berço. Foste sempre de uma simpatia extrema, disponível e sempre acolhedora nas mais diversas circunstâncias.


Tenho para todo o sempre na memória as muitas horas passadas a conversar, quando vinha da caminhada matinal e saboreávamos o pequeno almoço, tu com um pedaço de peixe frito da véspera e eu com um tira de pão alentejano cheio de manteiga e café acabado de fazer, ou à noite, com a casa em silêncio, degustando a nossa “ceia”, sentados com a uma caneca de café e queijo de cabra. Conversas intermináveis, que iam dos problemas familiares, políticos até aos mais vulgares e comuns do dia à dia. Era o nosso momento preferido, onde todos os desabafos eram possíveis.


A todos sempre dizia que “eras como uma mãe para mim”, e sempre te vi assim, mesmo quando nos últimos anos, deixamos de nos ver. Não porque não quiséssemos, mas por razões circunstanciais assim foi acontecendo. Nunca por esquecimento, ou falta de vontade, como sempre sabias.

Por isso, mesmo agora que partes, a memória de ti será sempre grata e permanente.


O teu genro.


FALECEU A PIONEIRA DA CIDADE DE SANTO ANDRÉ


Foi a enterrar, no dia 27 de Fevereiro de 2015, no cemitério da freguesia de Santo André, aquela que foi considerada a primeira habitante da Cidade.
Assim começa a nota sobre a tua morte.

“Margarida Gomes Matias Jones nasceu em Aljustrel, a 15 de Junho de 1928. Aí constituiu família. Ainda antes do 25 de Abril de 1974, o seu marido era um anti-fascista acérrimo, contra o regime e a favor de uma sociedade de progresso e democrática. Por este motivo, a família de Margarida Jones foi muito perseguida e reprimida pela PIDE/DGS, aumentando sobremaneira a sua angústia e o seu sofrimento. Com a Revolução dos Cravos abriram-se novos horizontes. Em Novembro de 1975, a família Jones rumou a Santo André, tendo sido, segundo várias testemunhas, os primeiros moradores do bairro da Lagartixa e do centro urbano. O seu marido f ez parte da primeira e única comissão de moradores deste bairro.

Margarida Jones desde sempre organizou iniciativas no Dia Internacional da Mulher e associou- se a todas as iniciativas do bairro. Por tudo isto, amou a Cidade de Vila Nova de Santo André.

Orgulhosa pela memória histórica desta Cidade, que não quer perder e em homenagem aos seus pioneiros, a freguesia de Santo André atribuiu a Margarida Jones, no dia 1 de Julho de 2012, a Medalha de Mérito da Freguesia.

Paz em sua memória!”




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O SILÊNCIO E O TEMPO

 

O silêncio abraça-me o peito,
sufoca-me o pensamento.

A data celebra um nascimento
de alguém que já não reconheço,
e acorda-me para as misérias que não esqueço,
verdades que não me escapam,
sonhos que não se realizam ...

Na família, incompleta,
faltam os afagos dos ausentes
e de outros presentes que não os libertam.
Foram-se pela noite.

Um novo dia nasce,
com ele o outro tempo, mais ontem.
Tempo mais rápido, mais lento...
depende de quem vive o tempo
como preenche o tempo.

No tempo em que o amor existe, cresce, se alimenta...
o tempo... não faz parte do tempo.

dc

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Se os outros dizem melhor



Se outros dizem melhor por que não usar seu dizer?

""“Um momento de felicidade.Sim! Não será isso o bastante para preencher uma vida?” (Noites brancas, pág.1083 )

Pois eu equiparo o amor com a felicidade. Quem pode ser feliz sem nunca ter amado? Quem pode ser feliz sem nunca ter experimentado esse sentimento genuíno? Quem possui força o suficiente para afirmar que a felicidade encontra-se nas efemeridades da vida, quando o Amor, esse bem durável que nos confere verdadeira estabilidade, independe de toda materialidade do mundo?"" -

Extraído do texto de Vanessa Rossi :
O amor que confundem os loucos e os sábios;
Amor é sempre amor em qualquer tempo ou circunstância.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Um chapéu à janela

A janela aberta é o sinal da tua partida. O chapéu pousado no parapeito, deixa a dúvida quanto ao teu regresso.
Sento-me olhando a água que reflecte o azul do céu, tento libertar-me, dos pensamentos obscuros, procuro a serenidade, Agarro-me aos sonhos, aos projectos, tento um fio condutor, para entender as razões do medo, que levam às decisões drásticas. Quero crer que nada é definitivo, um dia chegarás, e ao tocares no meu rosto somente sentirás os anos que se perderam.


dc

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

não foi ela escolheu


Nas ruas se perdia,
nas ruas seu corpo vendia.
o caminho, hoje seu
não foi ela escolheu.
Cedo violada,
empurrada para a rua
por alguém, que a fizera sua.
Daí nasceu o nada
em que se transformou.
um corpo que não sente,
uma mente ausente
numa vida naufragada
na esquina da madrugada.

dc

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

DIVAGAÇÕES


Poderia pensar que ele se tinha esquecido de lhe escrever, não era verdade, todos os dias lhe escrevia, só que não publicava, ficava tudo guardado nos recônditos da memória. Convencera-se que ela não entenderia se ele publicasse, isto é, se ela se desse ao trabalho de ler. Ela não gostava de fazer ou falar de projectos, para ele, na maioria dos casos, eram o tema dos seus rascunhos, alguns dos quais não foram sequer equacionados entre si. Ele não queria vazios, esquemas furados, pretendia algo mais de que uma entrega de encomenda com hora marcada. Amor tem projectos declarados.

A Casa do Lago ainda não tinha posto de lado, nem a viagem às ilhas, nem muitas outros sonhos e vontades, que por vezes conversavam. Continuava empenhado em ler e aprender, mesmo que o tempo fosse cada vez mais curto, usava isso como meio de se ausentar do “nós”. É mais fácil viver a vida dos outros nas estórias que os escritores inventam, afagando os nossos espíritos com mais ideias, vontade de sonhar, e com a vantagem de apurar raciocínios; de algum modo aprendendo efectivamente a ler e a escrever.
Há muita gente que pensa saber escrever, ler e interpretar textos, ele não pensava assim; quanto mais lesse mais aprenderia. Tinha a consciência, de que há uns predestinados que nada precisam para o fazer, e uns outros, como ele, que precisam de muita leitura e muito trabalho para conseguirem transportar para a folha os seus pensamentos.

Ela não sabia, mas ele continuava a passear diariamente, mas só esporadicamente o fazia junto ao mar. No entanto embora ela já não o acompanhasse, ele vivia tudo como se ela estivesse ali ao seu lado, fazendo-lhe companhia. Numa das últimas vezes em que foi para a marginal, junto ao rio, começou a falar sem reparar que ela já não estava ali; ficara com a sensação de que a vira baixar-se para fotografar as gaivotas e de repente desaparecera. Seria mais uma imagem fantasma criada pelo pensamento.

Não podia passar uma esponja sobre que fora dito, sempre pensara o amor como prioritário. Conservava ainda alguns elementos de referência que marcaram a distância e a partida, não de forma obcecada, mas fazia-o simplesmente para se lembrar que há marcas que não saem com uma simples lavagem da pele.

Ele sabia, que havia quem ajuizasse, como ela, pensando que distribuía o seu amor por becos e ruelas, mas na realidade, somente procurava juntar os diversos cacos de muitas estórias de sonhos perdidos e tempos roubados, fazia-o escrevendo, ou mantendo os rascunhos na memória, como uma espécie de catarse para encontrar outro rumo, e quem sabe, vir a concluir o puzzle duma de uma estória verdadeira.

DC



sábado, 14 de fevereiro de 2015

Namorar é bom e eu gosto...


Gosto das conversas intermináveis, dos beijos à média luz no vão de escada, namorando de noite até à madrugada.
Oferecer flores apanhadas do caminho, dos lugares mais improváveis, com cores suaves e cheiros de natureza a condizer com a tua beleza.
Gosto de namorar na mesa do café, mãos dadas sobre o tampo, brincando com os dedos que se beijam de vez em quando. Atravessar o espaço, num dançar de tango, para te abraçar e beijar tua boca de morango.
Gosto de ir restaurante, não no dia marcado, mas de surpresa, sem nostalgia só procurando um sabor inesperado e continuar namorando.
Gosto de ver teus olhos brilhantes, quando caminhamos abraçados junto ao rio, olhando extasiados os horizontes distantes.
Namorar é bom, mesmo quando a vida é difícil e o tempo é curto, tira a nossa alma do luto. Namorar tem cheiros, tem beijos, abraços e desejos, momentos de paixão, loucura, outros de cheios de ternura.
Até na angustiante espera, namorar é bom tem o encanto da primavera.
Não quero saber, se é dia de Valentim, mas gosto de namorar assim.

DC


E quase lá...



Quase lá, dizia eu, na verdade as minhas palavras se esbarram na incompetência para dizer do que sinto, não tenho a riqueza da linguagem dos poetas, não encontro a sonoridade adequada, nem consigo escrever as frases que melhor expliquem em imagens metafóricas o amor.

Pensando bem, para quê complicar, se o amor deve ser um sentimento tão claro, tão perceptível quando existe? Para quê as frases bonitas ou a descrição metafórica, para algo que à partida tem de ser simples, mesmo sabendo dos emaranhados laços e confusão de sentimentos que brotam de nós quando o amor acontece. Não será melhor dizer AMO.TE, olhando nos teus olhos deixando as ondas sonoras voarem para os teus ouvidos, os lábios tremendo, o calor ruborizando as faces, o estômago se agitando, o ar quase faltando e um desejo evidente de vontade de te aconchegar nos meus braços e te enlouquecer de carícias. Eu sei que os poetas, os artistas em geral, são criativos, dão fulgor ao que sentem, mas não somos todos capazes, nem artistas... e que diabo, muitos sabem o que sentem e são terra a terra no seu dizer.

Para quê inventar, se para mim é tudo tão claro, mesmo quando cafajeste ou até mais agreste, sou sempre aquele que te quer e te pensa mulher. Aquele que quer dividir contigo o espaço e o tempo, os filhos desejados, as viagens a qualquer lado, o amanhecer sempre esperado e o amor derramado no leito da tua vida. É assim que penso dever ser, mesmo agora, com o dia a nascer, já penso em ti mulher, haja o que houver será para sempre... o amor que a gente quiser. Será que me ouves? Será que me lês e percebes?

sábado, 7 de fevereiro de 2015

SEIS DE FEVEREIRO...uma data inesquecível



Ontem seis de Fevereiro, duas datas marcantes na minha vida. Um irmão há pouco falecido que faria sessenta e oito, o meu neto que fez sete anos. Para toda a vida ficam as duas lembranças agarradas, uma pela saudade, que fica para todo o sempre, e uma outra pelo significado de vida, seu crescimento e evolução. É a lei da vida, morrem uns, nascem outros num sistema de continuidade.

Do irmão o sorriso, amistoso, a vontade política na luta por uma sociedade melhor, que nunca descurou, do mesmo modo que no exercício da sua profissão de fotografo e juntos dos amigos e familiares, se devotava com toda a paciência entender as crianças com as quais se manifestava como se de um igual se tratasse. Para obter um retrato de uma criança, nem que tivesse de andar de joelhos ou gatinhar, tudo fazia para obter “um bom boneco”, como se dizia na gíria. Ficava feliz de mostrar os “bonecos” que obtinha. Em todas as manifestações, ou greves, onde estivesse uma criança, ela seria alvo da sua atenção de certeza absoluta.

Do meu neto o prazer de ver, cada ano que passa, a metamorfose que se vai verificando no seu crescimento físico e intelectual, A forma atenta e sagaz como vai engendrando diferentes saídas, em termos de expressão verbal, para esgrimir argumentos com os companheiros, com os pais e restantes familiares, e, como induz os outros, mesmo os mais velhos, incluindo os avós, a executarem as brincadeiras que ele gosta.
A escola primária tem sido um lugar de espanto e novos conhecimentos, onde tem dificuldade em manter o silêncio necessário dentro das aulas. Em casa delira na execução de desenhos e pinturas com que gosta de premiar os avós e as pessoas de quem gosta. Fala sem questionar com muitos porquês, trata sim de “dar a volta” conseguindo os objectivos que quer obter. Como costumo dizer é um safado. Nos últimos tempos já não vai à Fnac, ouvir as músicas para crianças, mas todas a que o agitam e fazem manear o corpo com trejeitos de bailarino. Até chama o avô para ouvir e indicar discos ao ponto de ter comprado um deles por sua influência, Para meu espanto ia da música de jazz a new age, passando por outras de chillout.
Fez sete anos e já a vida o agitou de tal ordem que parece uma “maraca”, das que ele construiu para apresentar na escola.

Duas pessoas, que me fazem saudade e alegria, duas pessoas que me acompanham, diariamente numa presença muito sentida e vivida e que me ajudam a entender e a suportar este
nosso fado que se chama vida.

dc

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

SE eu fizesse anos..


Se eu fizesse anos, que não faço, amaria que eles fossem a celebração, num dia, dos muitos anos de amor e alegria contigo na minha existência. Festejaria na intimidade como se fosse a primeira vez, sem dúvidas ou nuvens, com vontade de me dar-te. Seria sempre o nosso aniversário, vivido de ternuras, de beijos húmidos, de carícias e palavras doces.

Celebraria a data como marca de vida. Apagaria as velas e pediria desejos, Beberia champanhe comeria uma fatia de bolo e celebraria um amor sem mágoa, eternizado, tão forte reconfortante e sem idade. Um amor para além da morte.

Se eu fizesse anos, que não faço, nunca por nunca, deixaria que nada perturbasse, o amor do “meu amor”.

Eu não costumo dizer: eu te amo! mas se fosses o meu amor dir-te-ia a toda a hora como se sempre festejasse o teu aniversário.

Bem, eu hoje não faço anos, mas pensei em ti e quis deixar-te uma lembrança, para que acredites que às vezes o amor acontece.

dc

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

QUASE LÁ, quase lá



Sabia que o infinito era já ali, estava mesmo ao alcance da mão, olhava e via que estava quase lá, comecei a caminhar em direcção a ele, Sempre mais próximo, Horas depois ainda estava próximo, quase lá, mesmo à frente do nariz, Tal qual a linha do horizonte, sempre a vemos no mar, ao fundo, e temos a certezinha que vamos lá chegar. Assim, tem sido este procurar permanente para te encontrar, amor da minha vida, estás sempre tão próximo, quase lá, quase lá.

dc

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Fevereiro ... e a memória



Presa na tristeza de tanto te gostar, olho o chão enquanto o corpo se me fecha, não quero que sintas meu sofrer, nesta dor que me machuca.
Senti-te a correr no sangue, na pele e no beijo, senti-te por dentro do nosso desejo.Viveste o meu viver, foste o amor primeiro, estiveste comigo por inteiro.
Hoje, restam as lágrimas
correndo como rios no leito, fazendo o mapa dos cansaços vincando meu rosto. Não morrerei de amor. Matar-me-á o desgosto.

dc