terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

I'M NOT PERFECT...


Os dias passam vertiginosos, dez anos é o tempo de um sorriso, ou duma das tuas gargalhadas. Ainda ontem, davas o primeiro grito dizendo-te vivo e garatujavas uma língua de trapos, cada vez que tentava fazer-te sorrir. Hoje, um homenzinho, que emite opiniões, brinca, dança, agarras as pessoas com a sua malandrice, a sua traquinice, a sua ternura.
Como parecem já tão distantes, aqueles tempos de compromisso, em que eu e tu - ainda de pernas periclitantes, com a tua mão dentro da minha – visitávamos Museu de Serralves, ou caminhávamos pelos diferentes lugares da cidade, como o Parque da Cidade, o Palácio de Cristal, os jardins infantis que pululam por cá. Sem esquecer os pequenos almoços a dois, no Centro Comercial, para irmos de seguida à zona infantil e à Fnac escolher livros e música, ou as nossas caminhadas na Foz e na Ribeira.
Este ano lectivo, vou-te buscar à escola, sendo a tua companhia de fim de tarde. É o nosso momento In. Chegas à porta de saída, caminhando e cumprimentando: Olá avô! Com o pacote de sumo na mão, esperando que te dê as bolachas, a que te habituei, para ires comendo no caminho até casa; por vezes, digo que me esqueci, mas não acreditas, "vá lá avô, tu nunca te esqueces". Depois, depois conversamos e divergimos, rimo-nos e amuamos. A diferença de idade é mais do que muita. A idade dá-me a presunção da sabedoria, a ti dá-te a coragem de recusar os estereótipos, que te querem impôr. Assim vamos fazendo o percurso da vivência em comum, registando momentos das diferentes etapas de crescimento, solidificando os laços afectivos e criando memórias futuras. Como te lembras: “Eu não sou perfeito, mas sou edição limitada” , serve para os dois.

06FEV18


dc




segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Na vida real




Quando fugir
não faz parte de nós.

Se amamos a verdade,
mesmo quando dói.

Se a queremos
e tudo o que ela constrói.

É enfrentar sem temer,
nas falas e nos actos,
o ganhar ou perder.

Todo o seu contrário
é noite gelada,
são rugas na pele
e tristeza acumulada.

dc


domingo, 4 de fevereiro de 2018

Nunca dançaste comigo




Nunca dançaste comigo, mas sempre pensei que dançava contigo. Sabíamos o que era a valsa, o bolero, o tango, o chá-chá-chá, como vês não falo daquelas músicas modernas em que todos parecem ter pulgas e se mexem para se coçar.
Nunca dançei mas tería adorado que me tivesses convidado para dançar. Agarrar-te nos meus braços, sentir a tua respiração no meu pescoço e as palpitações do teu coração no meu peito. Rodar, parar, rodar, mexer os pés para o sitio certo, ao ritmo certo, sentir o calor do teu corpo e os nossos cheiros, misturados, entranhando-se nos sentidos. Gostaria de ter dançado todo o reportório que faz uma vida, quase tirando os pés do chão, como se voassemos num amor de todo o sempre, daqueles de filme, de romance de autor, daqueles que trazem brilho aos olhos e lágrimas de prazer e ternura. Aquele amor que é para sempre, aquele que se sente como certo, ajustado, único, especial. Um amor sem limites, que suporta tempestades, bonanças saturadas. Um amor no qual, pisaduras nos pés, são avisos de cautela e nunca são afastamento, ou o fim da dança. Sabes, eu contigo teria dançado tudo, mesmo até as tais modernices, em que todos se coçam, ou levantam os braços como se estivessem à procura dos gambuzinos. Eu contigo transformaria o mundo num salão de baile privado, onde daríamos lugar às grandes danças da vida. Nunca dançamos, é pena, seríamos um par perfeito, só que tu não acreditavas. Um dia dançarei de certeza com uma bailarina traiçoeira à qual não poderei escapar, aí, será a última vez em que trocarei o movimento dos pés, mas já não me importarei, tudo será efémero e finito.

dc

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Tatuagem


Tatuaste no meu corpo todos os caminhos, todos os destinos, todos os sentimentos possíveis, todos os lugares de apoio e passagem, como ultrapassar todos os obstáculos. Com teus dedos afilados desenhaste as suas formas, deste-lhe a tinta dos teus beijos, secaste-as com o calor do teu corpo. Hoje quando me enfrento no espelho, deixo-me invadir pelas memórias, aqueles traços trazem-me as emoções dos momentos em que a pele do meu corpo era teu objecto de criação e amor. Não há laser que as destrua, ficam para sempre instaladas na pele, como se com elas tivesse nascido.

dc

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Chapéus há muitos



Sobre a cabeça inclinada, tinha colocado um chapéu de cor clara, que lhe tapava grande parte do rosto, lobrigando-se o queixo saliente, e umas pequenas rugas em volta da boca. Aquela figura aparecera-lhe de repente do nada. Ele temia ver mais do que se via, temia encará-la se ela se revelasse totalmente. Possivelmente não seria o rosto que a sua mente mantinha vivo, e nos olhos provavelmente encontraria ambiguidade, indiferença ironia, omissão e porque não mesmo, mentira? Melhor seria não levantar o chapéu, assim tudo ficaria como antes, mantendo uma ideia positiva de alguém, que outrora, fizera parte do seu mundo de emoções. Quem sabe, se usar o chapéu não fora um modo inteligente de criar suspense, de fugir ao olhar do outro, assim sempre evitava que se percebesse que as palavras não casavam com o olhar. Talvez uma espécie de silêncio, uma forma diferente de chamar a atenção sobre si; “reparem no chapéu, no meu corpo, e esqueçam o que meus olhos dizem, ou o que sinto”, assim tudo se tornaria mais fácil, “chapéus há muitos”.

dc


sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Os anos correm




Os anos correm
As pessoas correm
As mortes ocorrem

Nos anos que correm
O tempo é dinheiro
E muitos morrem
Sem encher o mealheiro

Todos festejamos
Um aniversário que passa
Assim nos enganamos
No envelhecer sem graça

Melhor seria viver o dia
Sem contar o tempo ao segundo
Gozando tudo com a alegria
De ainda estar neste mundo


dc