
É difícil calar a voz que
dentro de mim deambula, dando voltas repetitivas para que não saia a destempo.
Tem entoações várias de acordo com os sentimentos, as emoções, os julgamentos que
faz, por vezes aconselha-me, outras manda-me à merda, Fala com a minha voz e a
de outros, como se de uma conversa cruzada. Uns dizem que devo estar
esquizofrénico, ouço vozes, outros dizem.. mentira, não são os outros que
dizem, é a tal voz que me segue. Sou um felizardo, tenho uma voz que fala tipo
ventríloquo e me acompanha. Nem sempre a melhor conselheira, anda para cima e
para baixo, parece não querer que o mutismo me tome. Dizem, lá estou eu, ela
diz que é a voz do senso, da ponderação do pensamento procurando a forma certa
de se ouvir. Na verdade enquanto ela fala eu calo-me para o exterior e permito
que os outros falem, digam de si, mais do que alguma vez o fariam, se eu
deixasse que meus lábios se abrissem para falar.
Hoje, aquela voz mais intima, falou-me de forma especial, aconselhou-me a
escrever o que eu pensava, pondo em palavras o que as vozes diziam, deixando
que livremente se registassem, Sugeria-me assim, libertar o silêncio de forma saudável
dentro de mim, com a possibilidade até, de mais tarde, poder lê-las e meditar nos
seus significados. De veras prefiro não as escrever, não gostaria de dividir
com toda a gente os meus pensamentos, prefiro a reserva mental, fazer sozinho a
catarse tentando descobrir o melhor e o pior de mim, ou dos outros. E depois o
que seria, sem a guerra do raciocínio, do pensar intenso, da vivência das
emoções, do avanço e retrocesso, da efabulação, da mentira criativa que
alimenta as nossas estórias? Certamente ficaria triste de perder esse diálogo
interno, e até correr o risco, de que esse famoso alemão “Alzheimer” me
visitasse.
dc
"precisamos resolver nossos
monstros secretos, nossas feridas clandestinas, nossa insanidade oculta. não
podemos nunca esquecer que os sonhos, a motivação, o desejo de ser livre nos
ajudam a superar esses monstros, vencê-los e utilizá-los como servos da nossa
inteligência. não tenha medo da dor, tenha medo de não enfrentá-la, não
criticá-la, não usá-la."
(michel foucault)