Sabia que ela era uma mulher, da
área das leis e muito responsável, que trabalhava imenso, sem perder o foco. Quase
diria obcecada, atitude essa, onde não sobejava tempo, para ter, o seu próprio
tempo. Esse seu modo de ser, levava-o a pensar, se não seria por ela temer, voltar
a envolver-se física e emocionalmente com alguém; uma espécie de fuga para a
frente, evitando confrontar-se, ou de libertar-se, dos espartilhos que a si
própria colocava. A ser assim, difícil seria encontrar o amor que tanto
ansiava, ou melhor, procurava alcançar. E seria bem possível, que o outro, nela interessado, se lamentasse: preferindo que fosse uma ladra habilidosa, sem
medo de ser presa, fazendo tudo, para o ter sempre perto dela. Atrevia-se a pensar,
se realmente, alguma vez, ela teria arriscado, a conhecer efectivamente alguém,
a sério. Temeria enganar-se na escolha, na expectativa, na figura de
preferência, como se na escolha do vinho, no vestido inadequado, do sutiã fora
de tempo, ou sem ele? Quantas vezes, teria ousado, usar a linguagem mais vulgar
na intimidade da cama, dando azo à imaginação, despida de pruridos balofos,
deixando o corpo surfar na onda do desejo, sem medo do que o outro pensa, deixar
que aconteça, sem perda de tempo, sem julgar o que ainda nem começou? Alguma
vez aconteceu o beijo espontâneo, a mão que acaricia, debaixo da mesa, quando
os olhos sorriem marotos? Alguma vez, andou pelas ruas, de mão enfiada no bolso
traseiro das calças dele e ele nas dela, rindo pelo prazer, da intimidade do
gesto, no aconchego de sentir os dedos na carne?
Sem erros, a realidade seria sensaborona. A fatídica certeza, traria a loucura,
seria ausente do prazer da aprendizagem, nos diferentes obstáculos no caminho
que se percorre, ou do gozo da concretização, ao alcançar objectivo traçado e o
sabor da sua conquista. Somos vítimas, de prisões intelectuais, do sistema ridículo,
que nos impõe as cadeias de comportamento social, que nos diz o que devemos, ou
não, fazer. Tememos o julgamento dos outros, deixamos de ser quem somos, para
sermos aquilo que os outros propõem que sejamos, mesmo quando nos apetece
correr pelas ruas à gargalhada, ou balançando os braços de mão dada, como se
pêndulos, brincando a embalar o amor que nos domina. Tantas são as vezes, que
nos apetece sentar no baloiço da nossa infância, sem receio da idade, ou vergonha, que
nos limite, e vogar naquele vai e vem que nos tira os pés do chão, para podermos
sonhar. E, porque não?
dc