segunda-feira, 16 de abril de 2018

Escrita de orvalho




Agarro-me a longínqua esperança de que um dia estarás lá à minha espera, algures num lugar sem tempo, de respiração volátil, sem terra firme, antes com nuvens debaixo dos pés, naquele sentir fofo, agradável, de quem vive a concretização de um sonho de forma inesperada. Quero-te na dobra, dessa esquina do tempo, em que tudo nos surpreende, fascina e nos faz acreditar que não há coisas impossíveis, mas estórias que demoram mais a concluir. Aquela pedra, onde um dia tropeçaste, já não está lá, o tempo e a evolução tirou-a do caminho. Agora somente existe espaço verde, um lago, onde os patos e cisnes ensaiam mergulhos,  caminhos ensaibrados onde as crianças correm, adultos simulam fazer exercício e os avós de mão dada fingem-se namorar. Por isso, é mais fácil, agora, teres a certeza de que podes vir descalça de todas as preocupações, sem pose politicamente correcta. Ninguém quer saber. Só eu repararei nos teus pés descalços, nas unhas pintadas, na saia curta e leve, na camisola de linho, onde os seios desenham promessas, nos olhos claros e brilhantes, nas madeixas do  cabelo, que esvoaçando, desenham estórias no ar.
Não sei se notaste, mas estava a escrever-te, quase sem me aperceber que o fazia, tão comum é perder-me em ti, nesta viagem perene em que existimos. 

dc

sábado, 14 de abril de 2018

A mentira.. a dois




A mentira a dois, a três a quatro, sempre a mentira, para salvar o que se diz certo, a mentira para fugir da monotonia, a mentira, criando agonia a quem mente, para se salvar  e usufruir da liberdade de ser quem é. Ele engana, ela engana, todos se enganam pelas melhores razões e assim continuam, falando e justificando para os seus botões: Se digo a verdade vou estragar a paz, se eu amo, porque dizer a verdade de que amando engano? Assim vai o mundo da relação a dois, todos polígamos dizendo-se monogâmicos, em encontros “kármicos”... sempre melhor sozinho/a do que “mentiramente” acompanhado....?

dc


segunda-feira, 9 de abril de 2018

Todos apelamos ao tempo



Todos apelamos ao tempo,
Todos choramos a perda de tempo,
Todos queremos ganhar tempo.

Inventamos uma máquina
Só para medir o tempo
Controlando os dias
Os anos e a nossa idade.

Melhor seria viver o tempo
Com tudo o que enche o presente
Sorvendo o outro tempo
Das diferentes estações do ano

Será que precisamos saber
A vida à hora, minuto, ou segundo,
Na angústia do tempo perdido
Como se fosse o fim do mundo?

dc

domingo, 8 de abril de 2018

DESPEDIDA





Só quero um abracinho
Disse ela com olhos d’água
E seu cabelo loirinho

Eu só quero um beijinho
Não quero esta mágoa
De te deixar sozinho

Eu só quero ficar aqui
Sempre ao teu lado
Bem encostadinha a ti

Esta é a cor do meu amar
Neste meu tempo limitado
Vou partir querendo ficar


dc



terça-feira, 3 de abril de 2018

Sonho Onde Não Saio





Estou perdido na maciez do teu rosto, na suavidade do teu sorriso, na leveza do teu andar, sinto o calor da tua pele nos meus dedos, a doçura dos teus lábios. Ouço as palavras que vais soltando, tantas vezes lendo-as nos lábios, preso na voz que os teus olhos falam, no cabelo claro que esboaçando realça teu rosto. Tudo isto, se não é amor o que eu sinto por ti, se não é a verdade do que somos em cada encontro e reencontro, então estou preso num sonho, onde não saio por ter medo da verdade.

dc

sábado, 31 de março de 2018

Há sempre uma estória




Caminhava pela tarde, com o sol baixando ao seu leito. A cor dos campos, dum dos lados do alcatrão, tinha algo de fantástico que preenchia o meu silêncio magoado. Na  memória o seu rosto fechado, com os olhos escondidos pelos óculos escuros, quando na paragem do autocarro se despediu de mim. As coisas ainda mal começadas, já tinham desenhadas o seu fim.
Naquele caminhar, nos meus pensamentos tudo estava a preto e branco, mesmo quando sabia das cores que se passeavam pelos meus olhos. As barras brancas, que no alcatrão marcavam o lugar de passagem aos peões, iam surgindo de onde em onde, como imagens num filme de dezasseis frames por segundo. Aquele repisar, branco e preto, preto e branco, fez-me reparar que as faixas não era totalmente brancas, e que elas em si, continham desenhos vários e relevos...afinal não era tudo preto e branco, tinham nuances e relevos. Se me deixasse levar pela imaginação, até veria que dentro daqueles meios tons, havia um horizonte, com árvores e um pequeno bichano de olhos arregalados observando-me. Ganhei o dia, ou melhor a tarde, sorri, e deixei que as cores do ambiente adentrassem em mim pela porta dos olhos.

dc

P.S. Numa imagem, há sempre uma estória por trás que a sustenta.