sábado, 16 de julho de 2016

CONVERSAS cruzar de palavras




É bom cruzar palavras em conversas descomprometidas, com respostas sem perguntas, tudo feito ao correr da fala, no jeito de quem não teme daquilo que se fez, faz, ou é, no deixar ir de quem quer comunicar com o outro, sabendo que o outro se liberta com a partilha que recebe. É bom conversar, quando as palavras se atropelam na necessidade de dizer, como se elas fossem empurradas para boca para serem soltas na ponta da língua. As conversas que são como as cerejas que se encadeiam no seu mastigar e vão sendo sorvidas enriquecendo o “músculo” cerebral. Conversas boas, livres da agressividade, do domínio de pessoa ou de conteúdos, livres de preconceitos, ou até pouco importantes, ou supérfluas, sobretudo importa, que nos acrescentem algo à vida.
As conversas, surgem em qualquer lugar, a qualquer, nem sempre face a face, quanto a mim as melhores, pois trazem consigo a proximidade, o vestir, os cheiros, os olhos e seu dizer, as mãos que se expressam como acrescento às palavras. Não desprezando as outras, mais de longe, analógicas ou digitais, hipótese possível no quebrar das distâncias, e que servem para inventar, imaginar, apelar à memória. As conversas, são um reinventar, um encontro, são fio condutor entre as pessoas. O acto de comunicar com o outro só por si é manifestação de partilha, de sentir a presença do outro, de quanto ele é importante naquele despegar das palavras e pensamentos que se vão revelando.

dc

“ A conversa é um encontro de mentes com recordações e hábitos diferentes. Quando as mentes se encontram não se limitam a trocar factos: transformam-nos, reformulando-nos, tiram deles diferentes conclusões, adoptam novas linhas de pensamento. A conversa não se limita a baralhar de novo as cartas, cria novas cartas. É essa a parte que interessa”

Theodore Zeldin- Elogio da Conversa

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Não demores...







Reservo-me calada, esperando, como sempre faço, como sempre farei até ao dia que chegares. Dizem que não é preciso procurar, ele encontra-nos, por isso me limito a esperar, então só digo, Por favor não demores muito. Da família e de alguns amigos eu sei que existe, mas aquele outro de que tanto se fala...humm é mais difícil. Até há quem diga, que já está dentro de ti, Se assim fosse, há muito teria sentido as borboletas no estômago, o chão a tremer, e a felicidade escorrendo dos olhos.  Por isso vem, não brinques com coisas sérias, não é só por mim, é por nós, porque quem espera do outro lado, da mesma forma sofre a demora, não é justo desperdiçar o tempo, que tanta falta. Sabes, a vida já é difícil com contigo presente, imagina, sem ti, como ela se torna mais dura para nós e para os outros com quem temos de lidar. Aparece, continuo sentada à espera....

cc

terça-feira, 12 de julho de 2016

"Reset"





Apagam-se os números de telefone, escondem-se as imagens, e as coisas partilhadas, sopramos para o ar, enchemos o cérebro de tralhas para que o pensamento se afaste, passeamos, mudamos de restaurante, enfim pretendemos esquecer e, de repente, abrimos um livro e... como se recuperássemos o disco dum computador, tudo surge da memória, um nervoso miudinho se instala enchendo os olhos, trazendo tudo à superfície, Nada do que foi zanga e tudo o que era diferença, se esgotou. Só vemos o sorriso, sentimos o cheiro, o corte do cabelo, o brilho e a cor dos olhos, o corpo e suas diferentes dimensões, e uma inesgotável referência às emoções... o calor das caricias, os beijos, os prazeres descobertos, tudo se desenha novamente perante nós... será que vale a pena apagar definitivamente o disco, ou será que o reset foi o sinal de que ainda está dentro do prazo, ou nada finda só por si...

dc

sábado, 9 de julho de 2016

Um lugar de espera





Seus olhos cor de mar, levaram-na para longe da origem de nascimento.
Queria pôr seus pés no areal imenso, com o mar se chegando de vez em quando para que sentisse o seu afago.
De quando em quando, olhos perdidos no horizonte, sem pensar na razão de estar ali, ia caminhando, sentindo o prazer dos pés penetrando a areia no seu pousar, e aquele cocegar das suas mil partículas, que lhe transmitiam segredos daquele mar imenso.Soltou o cabelo e deixou-o esvoaçar, queria que ele voasse ao sabor da brisa roçando o seu rosto de maneira desordenada, como uma caricia de um amor descontrolado usufruindo a liberdade de gozar e amar. Tinha a boca humedecida pelo beijo molhado do rebentar das ondas. O vestido comprido de tecido fino e florido, colava-se-lhe nas coxas, revelando-a, toda ela ondulando a cada movimento do corpo. O cheiro do mar entrava-lhe pelas narinas e as gaivotas marcavam o compasso nesse seu arfar. Era ela um ser sem tempo, sem encontro marcado, sem lugar de permanecer, um coração saltimbanco procurando abrigo em outra terra, melhor, em um outro mar, para se afastar desse outro mundo sem resposta, que fora seu lugar de habitar durante tanto tempo. 
Partir fora importante, deixara tudo para trás, cansara de viver em “Banho Maria”, precisava de estar viva. Queria mais que segurança e materialidade, queria emoção, sentimento, prazer de se sentir importante, amada, no cantinho recatado de alguém, onde fosse pensamento primeiro das sua escolhas.
Chegara àquele lugar que lhe abria uma porta de esperança, mais não fosse, no reencontro consigo própria, naquele passear quotidiano, pelos limites entre os pinheiros mansos e as dunas, pelo areal imenso, pelo beijo do mar, pelo ar repleto cheiros diversos.. todo um sentir dos elementos com que a natureza a bafejava, deixando-a com todo o tempo do mundo se desenrolando, sem pressa, sem objectivo pré-determinado, com o acaso como perspectiva.

Viver seria a perspectiva...sentir seria o possível... o agora, razão do seu estar.

dc


segunda-feira, 4 de julho de 2016

JUNTOS






O sol aquece
Trás calor à terra
Como luz trás à lua
Só me minha alma
Arrefece
Não estando perto da tua

dc



domingo, 3 de julho de 2016

REnascer





Hoje ela acordou-o de mansinho, com dedos suaves e lábios quentes, gozou do seu corpo, com o calor e luz brilhante que se exibia neste madrugar do dia.
Tem dias assim, em que algo de especial acontece, recebemos mais do que a rotina, somos a prioridade que entendemos merecer. Foi delicioso sentir o seu toque, que lhe tirou a ruga do sobrolho, o fez caminhar pelas ruas com um sorriso colado nos lábios, tudo observando com alegria e prazer. O céu azul matizado, de onde em onde, de manchas brancas muito leves, surgia ao seu olhar como se fosse a primeira vez que o via, Os edifícios, os diferentes verdes da vegetação dos jardins, as pessoas a sorrir, tudo parecia transmitir uma mensagem de paz, confiança alegria e vontade de existir. Sim, vontade de existir, coisa rara nestes dias conturbados de um crise que nos afasta de um viver mais alegre que todos merecemos.
Caminhar, ginásio, banho tudo feito num ritmo adequado sem pressas nem molezas, o quanto baste, aproximando a hora de almoço que um convite gentil o parabenizava.
Um almoço num ambiente e companhia bem agradável, de ementa simples, a condizer com a mesma simplicidade do estado de graça, com que o dia o começara a premiar.
Um pouco mais tarde, já caminhando no Parque da Cidade, após o repasto prazeroso e amena cavaqueira, continuava a afluir ao seu pensamento, o quanto fora privilegiado por algo que tanta gente gostaria obter. Ter sido beijado e tocado por ela, no alvar do dia, como nunca o fora.  Senhora de nariz levantado, difícil de ceder um pouco de si, dera-lhe a prioridade e lhe fez saber que também tinha direito a que acontecesse. Ela que tantas vezes solicitada, raro correspondia e lhe fizera sentir na pele a sua ausência.
O dia foi-se aproximando do fim, sem que as surpresas simples deixassem de acontecer. O neto e seus pais, fizeram questão de o ter na sua companhia ao jantar, oferecendo-lhe a sobremesa adequada ao momento.
Hoje sentira-se bafejado como nunca, pelo hálito límpido e agradável que nos trás esse sentimento raro, a que se chama Felicidade.

dc.
27JUN2016