terça-feira, 24 de janeiro de 2012

MÃE, NÃO SEI O QUE DIZER...



Como eu gostaria que este silêncio não existisse, nem estas cortinas que encobrem as minhas fraquezas e por vezes me impedem de ser humano.

Lembro-me de ti, carregada do luto, sempre com os olhos marejados de lágrimas, desde que o teu homem partiu deixando-te só, para enfrentares o resto dos dias. Sofreste, porque ele foi de surpresa, sem te dar tempo de despedida. Tombou de repente, quando ainda parecia estar capaz de defender-se das tuas pirraças ciumentas, das tuas desconsiderações perante a sua inabilidade, para te ajudar, como sempre fazia todas as sextas feiras. O teu dia de pôr ordem na casa. Ele não queria que te cansasses mesmo sabendo que tu, irritada, sempre encontravas defeitos. Só depois dele partir, perante nós, confessaste o quanto ele era querido pela sua vontade. Era esta também a sua forma de amor. Ele, homem de poucas palavras, mais de gestos, gostava de assim te dizer, seres única, mesmo com outros afazeres.
Ele partiu deixando-te um enorme silêncio, do qual jamais recuperaste. Ele deixara-te sem muro de queixas. Agora não tinhas a quem recorrer, para o teu desabafar das canseiras. Sobre os filhos, sobre a carestia da vida, sobre das dores que todos os dias te atormentavam e de que muito falavas. Dores que te pareciam alimentar a necessidade de viver, de tanto as contrariares, fazendo todas as tuas tarefas de mulher, mãe e avó.
A dor do teu homem que partiu, juntaste a do teu filho do meio. Partiu cedo demais e antes de ti. Choraste imenso quando soubeste do estado de saúde em que se encontrava. Acusavas de injustiça, esse Deus, que te não levava a ti, em vez dele. Era em casa dele, que pai e filho, se entendiam na sueca nos fins de dia domingueiros, e para os quais gostavas de levar o lanche para acompanhamento. Mais doloroso se tornava, porque os dois falavam-te de um espaço de vida, onde gozavas um pouco de descanso e alegria de conviver. Coisa rara.

A partida deles deixara-te vulnerável e nós, os filhos procuramos de algum modo, amenizar a sua ausência. Ainda hoje, me lembro das nossas pequenas passeatas, e a forma como tu exigias, quando a família saía em conjunto, ir no meu carro. Como tu adoravas, sair a almoçar fora, porque toda a tua vida sempre cozinhaste para família.
E como ficavas feliz por puderes tomar o teu chazinho. Saída sem chá, não era saída.

No final da vida foste uma doente difícil, após os teus fracos ossos cederem. Um dia uma perna, um outro o osso da bacia. Fatalidade que te foi tirando mobilidade e reduzindo à expressão mais simples. Passavas os dias sentada numa cadeira, ou deitada. Tinhas medo de te mexeres. Sofreste dores horríveis, enquanto teu corpo, sempre firme e activo se ia desaparecendo. Foste uma resistente e até à hora da morte. Não querias deixar-nos, em especial os que sabias, ainda precisarem de ti.

Este relato tão sucinto, não explica a totalidade da nossa vida em comum, é só um pequeno lembrete que surgiu, na data do teu aniversário em Dezembro. Não sendo uma mãe que criou os filhos com mimos, foste mãe, tão sempre, que ainda hoje fazes parte do presente.

Deixaste saudade.

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