quarta-feira, 29 de abril de 2020

Sonhar com um grande amor


Sonhar com um grande amor, por vezes é perigoso. É sabermos que fizemos do irreal a realidade que julgávamos certa, que acreditávamos no que queríamos ver, e não aquilo que nos era mostrado.

O ser humano tem uma capacidade e enorme de fazer cenários de acordo com as expectativas que cria para si próprio, e depois surpreende-se com os fracassos.
Talvez por isso, homens e mulheres, dos mais variados quadrantes sociais, culturais, políticos, vêm, leem, e falam de amor e tudo que ele envolve. Correm atrás do amor, para o receberem ou para o prodigalizar. Procuram-no como uma quimera, ávidos de sentir o tal sentimento, que na maioria dos casos desconhecem, mas tentam adivinhá-lo, nas diferentes manifestações. Às vezes descrevem-no de tal modo e dão-lhe tanto ênfase, que o tornam abstracto. Na verdade, tentam descobrir se de facto ele cria borboletas no estômago, se ele faz tremer, se o coração pula, ao ver a figura, ou imagem do objecto do seu amor.
Compram-se discos, livros, flores, oferecem-se prendas variadas, em dias procurados, ou em dias de êxito, compensando as ausências, ou as permanências menos certas.
Escrevemos, pintamos, trabalhamos, somos criativos e empolgámo-nos mostrando as nossas fraquezas, as nossas capacidades, debaixo da inspiração de um grande amor. Por vezes, ele só existe na imaginação, é musa de inspiração para toda essa criatividade, mas na realidade o objecto do seu amor, só existe na sua mente, ou estamos apaixonados e sós.
A realidade com a sua crueza mostra-nos o engano, a simulação, a inépcia, a incultura, a superficialidade, o mofo da mente, mesmo quando esta parece activa e moderna. Essa realidade encarrega-se de mostrar o apego, a dependência, a incoerência, como emoção que esconde o tal sentimento que ainda, na sua essência, não encontraram.
Quantas vezes o decorrer do tempo mostra, que aquilo que os unia era menor que aquilo que os aproximava. Quantas vezes perante o infortúnio se desmorona toda a expectativa criada em redor desse envolvimento emocional que se confunde com o amor.
O que parecia ideal, quando se distancia assusta-nos. Leva-nos a pensar que estávamos absorvidos por uma espécie de droga, que nos tirava o discernimento e cada vez mais nos impedia de raciocinar sobre o momento.
Será aconselhável a quem procura um grande amor, fazer como dizia um antigo professor que só casara acima dos quarentas anos: “Oh! Pázinho -tratamento carinhoso que ele usava com os alunos a quem respeitava - antes de casar escrevi uma carta à mulher, que era objecto do meu amor, dizendo-lhe que casaria com ela, se tudo o que pretendia e abaixo descrevia, fosse aceite por ela. Então enumerei, os vários itens, do que eu achava importantes para mim, para que fosse a minha mulher, e o que eu estaria disposto a fazer caso ela aceitasse. Ela aceitou e casamos”.
O seu casamento durou até à sua morte, já com quase oitenta anos. Era um casal amoroso, e de um entendimento ímpar.
Talvez para haver um grande amor, ou vir a ter um grande amor, fosse necessário, criar um caderno onde colocássemos as nossas vontades e desejos, uma espécie de deve e haver, onde os envolvidos deveriam expressar todas as seus valores, perspectivas, ambições, desejos, etc. do que querem para evitarem sofrer as decepções e não perderem tempo em “romances” de desgaste, como dizia a escritora, de roda-bota-fora.
De facto deve ser difícil adormecer e acordar, frequentar o mesmo espaço, com quem não se quer como companhia. O contrário também existe, e certamente, neste tempo de quarentena, talvez fosse o ideal para dizer, “ Agora, mais do que nunca, posso dizer valeu a pena termo-nos conhecido”.

dc 2012/2020




Sem comentários:

Enviar um comentário