quarta-feira, 12 de setembro de 2012

AMOR SENIOR

Chegaram, sentaram-se na esplanada, deixando que a brisa os refrescasse, ele era alto enxuto, com o cabelo todo branco, calças cinzentas de tecido fino, camisa branca, sapato preto clássico, apontando para uns 65 anos, ela baixa gordinha, não demasiado, talvez com menos idade, ligeiramente mais baixa que o seu parceiro, com um ar simpático, sorriso nos lábios, vestida com uma blusa simples, preta, e um colete leve por cima, saia de tecido florido daqueles que parecem sempre encorrilhados, sapato preto de meio tacão.

Ele tinha uma voz seca, com tonalidade autoritária, marcial, ela com uma voz e uma forma de estar muito daquelas mulheres que está habituada a trabalhar enfrentando a vida, Ambos pareciam gente boa em plena reforma, ou com a vida já bem assente.

Interessante a conversa que se desenrolou, percebia-se estarem ali depois de um almoço de domingo, a dois, gozando um espaço das suas vidas, talvez viúvos querendo reconquistar a vida. Ele falava de um qualquer baile do “arrasta o pé”, local que se subentendia ser comum aos dois, no qual uns amigos lhe disseram terem visto alguém conhecido, ela pronta sugerindo ir ao local passar um bocado. Autoritário, macho, disse logo que não, de forma seca, justifica de seguida, começando a falar de visitar a filha "hoje" que reclamava a sua presença, segundo ele, a filha lhe estava a cobrar quanto à forma como vivia a sua vida. Ele lamentando ter de reclamar quanto ao seu direito de fazer o que queria da sua vida e não admitindo interferissem. A senhora, a seu lado, corroborava falando da sua filha e dos problemas comuns aos dois.

Tudo isto em voz semi- audível, percebia-se pelo decorrer da conversa que viviam cada um no seu espaço e que viviam a aventura de um namoro sénior, maduro. Vozes sem agressividade, palavras soltas um à vontade saudável de quem gosta de se encontrar, para almoçar, viver os momentos, falando gozando as delícias do amor, e depois retomarem as suas vidas no dia seguinte até ao próximo encontro.

Namoro moderno em “gente antiga”. Cada um com o seu próprio espaço, cada um com a sua família, cada um evitando confusões de uma decisão precipitada de vida a dois, com as famílias se misturando, com as confrangedoras situações que se conhecem entre casais divorciados, ou viúvos, com partilhas e direitos discutidos ao milímetro. Vivem a “anormalidade” de não estarem juntos como mandam as regras sociais, preferem a sua independência, económica e social, o seu espaço, a manutenção das suas vivências com os amigos, a não obrigatoriedade, de, por gostarem terem de se colar na pele do outro. Certamente terão cada vez mais ânsia de se verem, cada reencontro será mais rico que o anterior, haverá mais estórias para contar, mais partilhas a fazer, mais beijos e carícias para dar, mais prazer de estarem juntos. Naqueles momentos a dois, estão disponíveis em pleno um para o outro.

Não pareciam, os dois, pessoas dotadas de grande formação e cultura. Não sei como deduzi tanto sobre eles, e o que levou a pensar onde aprenderam tal forma de estar, mas julgo que na verdade a sabedoria e a experiência de uma vida a sós, após um divórcio, ou viuvez, por vezes dá tanta riqueza e liberdade, que as pessoas dela não abdicam de modo fácil ou menos ponderado.

Viver juntos uma relação de amor, já não é única opção. Importante é a alegria de se amarem quando juntos.

2 comentários:

  1. Gostei desta história, talvez imaginada.
    Revi-me nela.
    Reflecte o que pode vir a ser a realidade desta que não gosto de chamar, 3ª idade

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  2. Ola. bom dia, gostei desta sua história e do seu blog. Vou voltar, fique bem.
    Maysha

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