quarta-feira, 5 de novembro de 2014

ESCREVER À MÃO




Tem-me faltado escrever ao correr da pena sobre o papel, sentir aquele roçar/deslizar permanente do “riscador” que aumenta ou diminui conforma a intensidade do discurso, reflectindo a pressa de nada perder do que atravessa a mente.

A escrita manual é feita do entrelaçar de caracteres, tal como as nossa ideias no seu fluir. O papel é acariciado pela ponta do riscador*, que faz surgir os caracteres num ritmo continuo só intervalado pela indecisão. Os riscadores tem cheiro, e as espessuras das linhas que desenham variam de acordo com a pressão ou a qualidade do material de que são feitos, enriquecendo o carácteres de expressividade.

No café, no comboio, à secretária, vendo tv, ou na espera em um qualquer lugar, surgem ideias e escritos curtos que são de enorme importância, para o desenvolvimento de futuros actos criativos da escrita. Surgem como pequenas notas, misturadas com desenhos, que serão embrião de textos de maior dimensão, ou somente um registo de ideias.

Escrever à mão, quando os textos são extensos, implica motivo, ambiente, prazer de escrever.
Houve um tempo, que só escrevia, com canetas de tinta permanente, outros períodos com esferográficas, e em determinada altura, nem uma coisa nem outra, usava simplesmente a lapiseira, escrevendo com grafite, pedindo desculpa por isso. Quando se escreve à mão até a correcção é um acto de prazer, ao riscar com força, na folha do papel quando queremos emendar.

Quando escrevo numa máquina de escrever, ou no teclado de um computador, as teclas são individuais, não existe um continuo quando se “tecla”, existem uns dedos que se levantam e descem com rapidez, as teclas falam com o seu ruído, por isso se diz matraqueando as teclas, num cantarolar repetitivo, que para alguns interfere quebrando o raciocínio e o silêncio. Teclar é um meio frio de comunicação.

Por tudo isto, periodicamente tenho de escrever à mão, mesmo que depois tenha de passar para o computador, escrevendo com as tais teclas, mas nessa altura já passou o problema da criação e portanto torna-se acto mecânico.

Escrever à mão, em si, é um acto lúdico que dá imenso gozo. As tecnologias são importantes, mas não devem predominar sobre os prazeres da vida, penso eu.

DC



*Riscador: É um instrumento pena, lápis, caneta, esferográfica, pincel, buril, etc. que tem características próprias, de apor em cima de uma superfície especifica, formas expressivas sejam elas letras, desenhos, pinturas, ou gravuras.

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