quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Se as Árvores tivessem voz





Vejo-as de braços erguidos rasgando o ar em direcção ao céu. Atento nos seus nós, que marcam datas de vida e momentos, Quase lhes sinto a seiva circulando. Penso-as vivas e sensíveis às interferências do terreno que as suporta, do ambiente que as comporta. Nos seus milhares de galhos, todos intrincados, desgrenhados, crescendo de forma variada, sem folhas, ou carregados delas, sempre nos dando sombra, frescura, protecção e melhorando o ar que nos rodeia. As árvores mostram uma complexidade, numa única vida, comprável à estrutura social dos humanos.
Se as Árvores tivessem voz, falariam das diferentes estações do ano, dos diferentes golpes que sofreram para que pudessem crescer. Explicariam a sua militância como vigilantes de protecção do ambiente, da sua função de travar os ventos, de como as suas folhas servem o revitalizar do solo. Talvez nos dissessem dos pássaros e seus ninhos. Apontariam facilmente os incendiários que as aniquilam e as transformam em carvão, ou pasta para papel. Teriam opinião sobre os golpes dos lenhadores, da sua  cantilena em voz sonora, que activa de forma enérgica o seu esforço num misto de alegria e tristeza do derrube, em contraponto com essas máquinas sofisticadas, que agora se usam, e facilmente as abatem, sem quase se lhe apercebam o choro. Fariam um relato real das muitas companheiras abatidas, para servirem um bem maior junto dos humanos, daquelas que indiscriminadamente são abatidas no amazonas, e doutras para que o betão possa crescer. Se elas tivessem voz diriam das muitas estórias que presenciaram, e de algumas que sentiram na sua pele, ao marcarem-nas com desenhos, feitos com objectos cortantes, por namorados, amigos e diletantes, como registo dos seus desejos. De quantas vezes foram companheiras de silêncios desesperados, de desassossegos, de confidências, com que muitos passeando entre elas, vão desfiando em voz inaudível. As árvores fazem perceber um pouco a razão do meditar, quando no seu silêncio nos acompanham.
Olho-as, vivo-as, choro-as. Encantam-me com a sua beleza quando as observo, não me canso de as olhar, com olhos de ver, e de sentir que elas são diferentes todos os dias e são companheiras imprescindíveis neste passear da natureza e da vida. Gosto de apreciar a forma como rasgam os céus, como sussurram com os ventos, como nos acobertam. Aproxima-se a Primavera e elas novamente trazem cor e alegria ao ambiente, com os seus rebentos e flores que convidam ao sorriso, à corrida pelos campos à alegria de estarmos vivos.

dc


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