domingo, 23 de fevereiro de 2020

A memória do beijo acompanhava-o


Sentou-se no mesmo banco, onde sempre se sentavam, vendo as margens do mesmo rio. Agora só havia uma única sombra, marcando o chão cinzento. A cor ambiente, no entanto, era dourada, tão dourada como dourados eram os sonhos que naquele banco, foram tecidos, quase sem palavras. As pessoas circulavam de forma prazerosa, aproveitando a nesga de sol e calor que neste final de inverno começava a abrir as portas à primavera. Embora fosse Carnaval, viam-se grupos, talvez famílias, conversando e caminhando; homens e mulheres correndo ou andando de bicicleta, outros com os cães à trela. Havia pessoas sentadas em bancos conversando, ou simplesmente deixando correr os olhos pelo rebuliço e beleza que a paisagem lhe trazia. Ali estava ele, como era seu hábito. Os pensamentos vagueavam sobre o significado da frase que lera: guarde o melhor beijo da sua amada, na sua memória, para a ele recorrer para lhe adoçar e tornar mais fácil superar a angústia e a saudade. O sol ia caindo e a sua luz reflectia-se na água. Levantou-se, seguiu pela margem, caminhando em direcção ao pôr do sol, captando as sombras de outros, os sorrisos alheios, o contra luz nas árvores, o desenho dos barcos parados, balouçando nas águas. Havia um ruído de fundo e uma brisa mansa, que lhe trouxe um sorriso aos lábios. A memória do beijo acompanhava-o.

dc

1 comentário:

  1. Estarmos atentos aos detalhes é muito mais do que apenas ver.

    ResponderEliminar