quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

O tempo de amar



Parecia estúpido dizer, que as palavras de amor se afadigam na procura do lugar e tempo certo onde pousar. Havia uma razão para assim pensar. Elas não devem ser desperdiçadas em algo morto, insensível à sua força e ao que delas se depreende. Passaram milénios a  serem usadas e a ter expressão na boca, nos escritos das gentes e na mente de tantos escritores, que lhe davam quase sempre o lugar certo e o momento adequado a serem utilizadas. Não entendia porque se menorizam os tais escribas e superlativam os trejeitos materialistas e tecnológicos, onde as mesmas palavras se tornam mais frias e são distribuídas a granel, quase se perdendo, como anunciando um prematuro defunto. Agora já não se olha o mar e a sua linha do horizonte à procura duma resposta, fica-se pelas imagens, artificiais, plásticas, limitadas, de uma qualquer plataforma digital, imitações distantes, ausentes da dimensão real, dos cheiros, das texturas que não se tocam, onde as palavras vivem como hieróglifos. Quando as pessoas perante a realidade, já não caminham olhando na direcção dessa linha que faz divagar o pensamento, preferindo agarrar horizontes em imagens perdidas de sentimento, fica o amor desaparecido no buraco negro da ignorância. Assim, vai-se desfazendo o conteúdo, a sensibilidade e o amor das vidas a dois, das famílias, entre humanos e os próprios animais. Não falta até, quem escreva, como se de uma evolução se tratasse, dizendo que um dia no futuro próximo, será um mundo de homens e mulheres sós, onde as expressões de amor, faladas ou escritas perdem o significado e força de outrora. O tempo de amar é roubado, para sobreviver numa qualquer profissão que traga o pão à mesa, sustente os Big Brothers e as maleitas de uma sociedade que visa somente o lucro.
Todos sabemos que existem ciclos, mudanças, a que nos vamos adaptando e são inerentes à evolução do ser humano, mas há também quem se afadigue, a que aceitemos tudo, até um retrocesso, como sendo evolução. Também sabemos que nos procuram colocar num contexto diferente, falando da inevitabilidade disso acontecer, como se a evolução dos seres humanos, fosse destinada a matarem-se uns aos outros, naquele fatalismo do “sempre houve ricos e pobres”, ou “sempre houve guerras” e não a de construir algo melhor para si próprios. Ouvimos as pessoas dizendo aos que amam não terem tempo. A pais, filhos, avós, netos, amigos, e por aí fora, assoberbados com as tarefas que a sociedade lhes coloca nas suas diferentes áreas de acção, e eu pergunto-me: Se as pessoas não têm tempo para se dedicarem a viver e aos que amam, o quê e quem amarão elas, e de que vale viver a vida?

dc


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