Nós somos os que ficamos, depois da partida, seja ela para onde for, de modo temporário ou definitivo. Aqueles que nos deixam, marcam-nos pela ausência, em eterna memória, e esta, mesmo que mitigada com o correr dos tempos, está lá sempre como risco num disco de vinil que mantém eternamente a repetição das notas musicais. Ficamos com o que nos deixaram por esclarecer e resolver, com os traços que faziam o desenho do seu espaço de estar, com o reflexo das suas atitudes, com o que produziram ou ficou inacabado. Ficamos com a tarefa de buscar entendimento, para toda a confusão que restou após a ida. Doamos aquilo que nos incomoda, pagamos o que não devíamos, percebemos que afinal que era um alguém que nos amarrou à sua vida e nos deixa a responsabilidade de gerir as falhas, para que a imagem se mantenha de algum modo limpa. Nós ficamos e nem sempre da melhor maneira. A sua ida facilitou a resolução das suas preocupações, legou a terceiros a resolução dos compromissos que assumiu sem imaginar, a forma mais adequada de deixar aos outros as boas memórias de si. Somos nós os que ficamos, que esquecemos tudo o que de menos bom existiu e agarrámo-nos às emoções e às coisas positivas, que a triagem da nossa memória faz realçar, enquanto se vão diluindo os traços mais grotescos.
dc
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