Está sentado no banco do jardim. Veste uma espécie de fato-macaco escuro, com
marca de uma empresa, no peito do blusão, que parece ser de uma oficina mecânica,
talvez a mecânica seja a sua profissão. À sua frente, e nas suas costas, estão
os prédios da cooperativa, que tem um nome sugestivo “Gente do Amanhã”. Não é a
primeira vez que por ali está. Aquele é o lugar, que parece ter sido, escolhido
para se isolar e fazer o seu almoço. Ele chega, encosta a bicicleta no
gradeamento, e ali, longe de restaurantes acessíveis, e possíveis, tira a sua
bucha e com ar meditativo inicia o seu repasto. O seu olhar, abrange a zona
ajardinada e a parede do prédio à sua frente. É um olhar vago, como que perdido,
entre a mastigação e os pensamentos que o assaltam, naquela meditação
procurada. Os pássaros, sentem-no e na ânsia de encontrar pequenas sobras,
rodeiam-no de forma agitada, em diferentes pio, pios. Os melros, que abundam
naquele lugar, percorrem a zona relvada, movimentando-se na procura de galhos e
comida. Nem a sua graciosidade, motiva a sua atenção. Nada parece afastá-lo daquele
ar vago. Está, como se procurasse encontrar a explicação, para aquele seu,
estar ali. Fica-me a dúvida, se a razão de estar ali, tem a ver com uma razão
de ordem económica, ou simplesmente, foi uma forma por si escolhida de
encontrar a própria paz. No meio de toda a luta diária, dos dias de hoje, encontrar
paz, e recuperar o equilíbrio, é quase obrigatório, para sobreviver.
O primeiro de Maio, dia do trabalhador, celebrou-se há alguns dias, muito há
ainda para lutar. Questiono-me: será que ele pensa, na gente do amanhã? Terá
ele algum dia ouvido, ou lido, o poema de Vinicius “Operário em construção”?
dc
………
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.
(última parte do poema "Operário em construção" de Vnicius de
Morais)
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