Gosto de me esperar, único, na
sozinhês do banco de jardim. É domingo, a manhã está amena. Observo de modo
meditativo, as árvores e as flores sobre o jardim, os pássaros, que neste meu
esperar silenciado, me acompanham com o seu cantar melodioso, e não sabem,
muito menos, adivinham, o quanto me fazem companhia e alegram. Fascina-me a sua
graciosidade, o seu saltitar, nervoso e dinâmico, sobre o tapete de relva, ou o
seu voo fugaz para a árvore mais próxima. Todos parecem iguais de morfologia,
mas distintos na cor e desenho bem diferenciado, como que cada uma das suas “famílias”
se identifica. O melro, que do preto só se distingue o seu pequeno bico e as
rosadas patas; o pintassilgo de roupagem colorida, a poupa, encristada em cores
sóbrias, a pomba acinzentada que parece ronronar, o raro canário amarelo de
cantar distinto, e nos dias de hoje a predadora gaivota, fugida do mar e das
docas, se passeia pela cidade, onde esgravata dos seus lixos abandonados, na
busca de comida que no mar já não encontra.
Tudo isto neste esperar pacífico,
onde estou, tal estátua, indiferente para quem me vê. Invisibilidade que leva
ao engano, a pomba breve junto aos meus pés e o cão surgido, que se encosta de
necessidade na minha perna, logo fugindo de espanto perante o meu prolongado, shiiitttt.
Chegam até mim, trazidos pela brisa, aromas dos diferentes comeres das casas
próximas, vêm enunciando, o menu melhorado, domingueiro. Vêm matizados com os
odores do jardim, uns de refogados de cebola, estalando, outros de assado de
carne melhorado, ou peixe grelhado. As vozes das gentes, que ali habitam, diluem-se
em murmúrios entrando pelos ouvidos, rompendo o ar com facilidade. Enquanto
isso ruídos dos carros da cidade se esbatem na lonjura. Adivinho naquelas
casas, os banhos matinais domingueiros, apurados pela ausência da pressa, as
barbas que se desfazem com cuidado, as mulheres que se perfumam e cuidam do seu
rosto. Todos escolhendo cuidadosamente as roupas que saem da rotina do trabalho
e surgem como a estrear. Como se à missa, todos tivessem missão por ir. Também
posso lobrigar, muitos outros que se aproveitam, do lazer possível, e desfazem
o tempo como lhes apraz, abandonando-se num desmazelo procurado, de indolência,
tudo feito a desoras, distraindo-se a ver televisão, ou até um possível sexo
gostoso e assim quebram a rotina do trabalho da semana.
Sinto-me num domingo
adormecido, como aqueles que premeiam a Páscoa de todos os anos, com nuvens que
se misturam na leveza do céu, brancas e cinzentas, que o sol vai furando em
entretantos. Este é um domingo sem falas, nem interrupções, neste meu observar
e pensar, onde também eu me cuido estando só.
dc