sexta-feira, 6 de julho de 2018

Tanta parra pouca uva





Vestida de sedução, esfriou todo o calor na frase que o discurso destapou. Morta a centelha, o tecido que desenhava a imagem, como cortina que se afasta na janela, perdeu-se na visão do pensamento que surgira. "Tanta parra pouca uva"

dc


quarta-feira, 4 de julho de 2018

Não Fazemos Anos





Não fazemos anos
São os anos que nos fazem

Os dias não são contados
Somente partilhados

Tantos abraços recebidos
Outros tantos falhados

Os amigos sentidos
E alguns que nunca foram

Os beijos dados e vividos
E muitos outros perdidos

Os amores e sua saudade
Ou o desamor e sua verdade

Tudo importa na caminhada
Menos o fim da estrada

Muitos ou alguns enganos
Tudo faz parte dos anos

dc



sábado, 30 de junho de 2018

Olá avô!






Olá avô!
Aninhando-se no meu abraço. De Seguida, “As minhas bolachinhas?”
Como princípio de comunicação, desde o início das aulas, levava-lhe bolachas, de escolhas variadas, para não saturar, para aconchego do estômago e mimo. A primeira vez foi uma surpresa agradável, que o fez ficar de sorriso aberto.
O ano escolar agora findo, teve uma partilha entre nós, quase diária, aos fins de tarde na saída das aulas, quando o ía buscar. Foram momentos de aprendizagem muito bons para ambos. Umas vezes conversávamos divertidos, outras, na sua “idade do armário”, arrebitava-se e tentava ser esperto ( não digo, inteligente..), e aí, se entornava o caldo, e tinha de lhe fazer perceber que não era o amigo, sim o seu avô. Quando abusava nas divergências e atitudes menos correctas, fazia o favor de lhe passar a mochila para dele, ou deixava de conversar e logo ele se apercebia e começava a tentar solucionar a divergência. No entanto eram coisas de somenos importância, na maioria das vezes eram momentos muito curtos. Na maioria das nossas caminhadas até casa, conversávamos sobre as suas aulas e como lhe tinha corrido o dia e ele fazia o mesmo comigo, se eu não estivesse muito comunicativo, começava o interrogatório para saber o que me perturbava. Falávamos de algumas regras de adultos e crianças e entre si, assim como de outras mais ligadas às emoções, aos gostos e à diferença de valores entre nós. Em certos momentos colava a sua mão, pequena a papuda, na minha, para fazer a sua cena de equilibrismo na borda de cimento dos jardins de rua, e eu sentia um estranho prazer de o sentir confiante.
A escola colocava-lhe tarefas e eu no que podia ajudava. Construímos juntos, um presépio para apresentar, que o deixou inchado de orgulho. Abri-lhe uma página na net para escrever, os seus “blogs”, com a devida atenção, dos pais, a net para eles, tão cedo, assusta-me. No dia em que quis interferir no conteúdo, fez o favor de me chamar a atenção para que eu percebesse que a sua forma de escrever era a dele, e os conteúdos também. Tentei que escrevesse um diário, sempre era mais fácil do que ter acesso ao computador, para isso dei-lhe um livro em branco para nele escrever.
Agora no findar do ano escolar veio dizer-me que tinha um baile de finalistas do quarto ano, disse-me do tipo de roupa que ia levar e quis saber a minha opinião, ao mesmo tempo que me dizia que eu tinha de escrever uma frase para o livro de curso. No quarto ano já se fazem coisas destas? Fiquei admirado, dei a minha opinião sobre o que me parecia ser o melhor e mais adequado para ele vestir e trocamos opiniões e, mais tarde, escrevi a tal frase,
Enfim poderia estar aqui a descrever coisas, que só um avô babado pode escrever, mas também sei que com o correr dos anos muita coisa muda, por isso fico com o prazer de guardar para mim, como guardo os textos e desenhos que me dedica, como no meu mais recente aniversário. O neto não me envelhece, faz-me valer o tempo, me engrandece em conhecimento e me acorda para o muito que posso fazer para nos enriquecermos.

dc





sexta-feira, 29 de junho de 2018

Como dizer...




Se eu conseguisse explicar o teu olhar, o sabor da tua boca, as linhas do teu rosto, o ronronar do teu sono, a dança do teu corpo, o som da tua voz quando falas, a tua inteligência, a qualidade do teu raciocínio, os teus desejos e vontades, muito mais fácil seria perceberem o meu amor por ti.
dc

domingo, 24 de junho de 2018

Partir...




...partir tem a despedida, a marcação na pele, as horas, a saudade, o tempo de regresso, o recomeço, ou não, o ponto final, o anseio de chegada ao outro lado, o regresso se encontrada razão, o medo de perder, as memórias, as noites de insónia, o verão o inverno, o inferno. Nunca sabemos bem, se fizemos o melhor, perante o que vem a seguir, as dúvidas acentuam-se, acrescentam mais pensamentos, imagens, discussões reais e imaginárias, razões e não conformidades.  No calor dos acontecimentos reagimos, só reagimos, se analisássemos seria sobre a pressão do acontecido e não teríamos o discernimento para o fazer melhor opção. Sabemos que uns tempos depois surgem os arrependimentos, já não se avalia a verdade, são a solidão e o silêncio, a criarem-nos a conivência e conveniência de aceitarmos tudo, para acabar com aquela incerteza e vazio. Na realidade só o passar dos anos, muitos ou poucos, acompanhados pelo esquecimento que se vai plantando, permitirão a verdadeira consciência do momento, talvez uma leitura aproximada dos factos. Ainda assim com tudo isso, vou pela noite dentro procurando o aconchego das tuas mãos. No sonho, fico perdida nos teus lábios, quando acordo, o corpo suado do pesadelo da tua ausência.

A sala permanece silenciosa, nas paredes os quadros com pinturas e fotografias, e algumas centenas de livros, são a única companhia.
Na rua, os foliões dançam e pulam, é S.João. Ela só vê o alcatrão negro da rua que demarca o edifício, o resto é só ruído.

dc

terça-feira, 19 de junho de 2018

Tem dias assim




Tem dias em que as estórias não acontecem, ou passam ao nosso lado.
Tem dias em que as palavras não surgem, e aliam-se à falta de estória.
Tem dias em que se perdem amores, por faltarem as palavras para contar a estória.

Hoje não tinha argumentos para falar da minha estória, esclarecer as razões dela existir. A estória passou à história, mal o pensamento nasceu, perdeu-se no labirinto de explicações prováveis e logo foi passado. É isso que magoa, nem tempo houve para que fosse vivida, morreu ao nascer.


dc