Sinto-me agredido, por essa vozearia,
na comunicação pública. Sei, que trazem as palavras, constroem frases, cruas,
duras, ensanguentadas que exacerbam as emoções. A mente se desgoverna sem freio,
vai em direcção a um lugar indescritível, talvez pelo terror do que se lhe apresenta,
talvez pelo medo de se conscientizar, que afinal é realidade, não um
pensamento, ideia ou sonho. Uma rede estruturada, de comandos subliminares,
transmitindo, de fora para dentro, tenta influir, no que a mente elabora, para que
ela por si só, vá ao encontro do caminho que lhe destinam. Sinto que ela tenta
tocar o meu íntimo, e então me apetece perder a humanidade. Cortar
definitivamente com essas gentes, que se me apresentam tão miseráveis, que vulgarizam
a vida, tomam misseis ao pequeno-almoço, drones como aperitivos, arrotos ao
almoço e no desenrolar da janta, bombas neutrónicas como sobremesa, nesse
espaço de descomando da humanidade. No meio disso tudo, corpos inocentes caem
na terra, tal qual adubo, satisfazendo estômagos milionários insaciáveis.
Quanta vergonha, conseguirei aguentar, para que se não solte o verbo, ou a
fúria embraveça o gesto?
dc
quarta-feira, 16 de outubro de 2024
História Perversa
terça-feira, 10 de setembro de 2024
A linha que alinha
Talvez linha
Talvez ideias em linha
Se alinham ideias
Com as formas da linha
Quando juntas as linhas
Na expressão do corpo
As linhas conformam
Contornam
Sem desconforto
Linha do rosto
Linha do seio
Linha da coxa, da anca
Da vulva no meio
A linha espanta
Dó ré mi sobre a linha
É a linha da pauta
Na música que se canta
Os pontos fazem a linha
A linha justifica os pontos
Esclarecendo a linha
A dimensão dos pontos
É a estória da linha
No mundo dos contos
dc
quarta-feira, 21 de agosto de 2024
Noite de Lua Cheia
Apontávamos com os dedos, fazendo desenhos abstractos, como se pudéssemos atravessar o espaço e tocar nas estrelas, estas que pareciam depositadas como pontinhos, no céu escuro, tal como poeiras sobre os móveis, na casa que deixáramos abandonada, para sermos observadores do Universo. Como não somos estudiosos dos astros, mas curiosos daquele infinito que na noite se torna tão visível, é-nos permitido divagar sobre a natureza das coisas, ou das coisas da natureza. De preferência, namorando, em noites de lua cheia, com gatos no telhado.
dc
domingo, 18 de agosto de 2024
Pensar bebendo chá
Eles, envelhecem-nos com as
suas falas, como se a sua modernidade, e a tecnologia, lhes desse o direito a
todas as coisas, e nós, nos reduzíssemos a peões das suas necessidades.
Confundem anos de existência, com a juventude do nosso ser, e a experiência
alcançada. Na realidade, nem sabem, quão longe estão da verdade. Por culpa própria,
sempre os criamos, afastando-os das dores, e dificuldades que nos trouxeram até
aqui. Nós temos o privilégio de viver memórias plenas de cheiros, de olhares
que falam e tudo colhem do que se nos permite observar. Vivemos sensibilizados
pelo que tocamos, agarramos os significados das palavras da sua suavidade e
dureza para nos expressarmos. Abstraímo-nos de procurar fixar o presente em
caixas, queremos sentir e viver, todas as recordações, más, ou boas, que nos
ajudaram no caminho. Não queremos exibir, a dureza das nossas dificuldades para
sensibilizar os outros, queremos que sintam a riqueza do nosso caminho e
história, se possível, ajudarmos a melhor observarem e viverem o seu, que agora
começam.
dc
quinta-feira, 11 de julho de 2024
Diálogo invisível
Espantado com a claridade do seu
olhar, transparente, puro. Um olhar que se adentra no meu, fixando-me na sua
infinitude. Fala-me de amor sem que as palavras se soltem, mas ouço-a num
sussurro dentro de mim, é um diálogo invisível, que só os dois entendemos. Tudo
acontece, como se fora previsto, sem sobressaltos. Os corpos movimentam-se, convergindo,
com um fio condutor que nos hipnotiza. Quando perto, o seu perfume sobressai, e
o calor do seu corpo, faz-se sentir no aflorar da ponta dos dedos que se tocam,
milésimos de segundos antes de as mãos se apertarem, e os corpos se enlaçarem
na linguagem frenética do espanto. Movidos por certezas, que não sabemos
possuir, que se afirmam nas letras que compõem esse sentimento, que alimenta a
alma dos poetas, é tema de filmes, enriquece performances em diferentes palcos
da arte e da vida. Somos possuídos por uma espécie de montanha-russa de
emoções. É incrível a abstração pura do que nos envolve, ambos deitados num
colchão de nuvens, inexplicável ao comum dos mortais.
Tanto tempo passado desde que acontecera. Quase em apneia, acordo assustado,
procuro os teus olhos, e encontro a almofada vazia. Já não estás ali como eu me
habituara, nos muitos acordares. Partiste com serenidade, no seio da dor que te
magoava o corpo. Agora, só cheiros vários e objectos sinalizam a tua passagem.
Encolho-me sobre o meu próprio corpo. Encosto os joelhos no peito. As lágrimas
correm, afinal foi tão curto o nosso tempo de viver. Dizem que o Universo, planeia
tudo, mas porquê ser tão frio e calculista ao atribuir-nos um tempo de partir,
quando queremos ficar?
dc
terça-feira, 9 de julho de 2024
Abstração
Fala-me,
eu escuto, mesmo que não conheça a tua língua, estou capaz de te entender. Tu
falas por ti, e por mim, nesses gestos vagos de nada dizeres. São desenhos
abstratos, feitos no ar, nessa imensa lousa onde existimos. Como explicar aos
outros, que a nossa linguagem é subliminar, que só olhamos os movimentos, a
agitação e clareza do olhar, o mover dos lábios mudos, dizendo para lá do
espelho que nos envolve. A energia que se liberta, comunica e desperta a
consciência daquilo que é intrínseco de cada um. As palavras não fazem sentido
naquele permanecer, alguns sons, talvez, alguns cheiros, certamente. Ligados
pela abstração de um sentimento, que não sabemos explicar, restamos sentados,
próximos, marcando o compasso da respiração surda, serena no peito. As horas
passam, o dia nasce e morre como se não existissem limites. Abrimos uma porta,
que não sabemos onde vai dar, nem se pode ser fechada. E pouco importa que
assim seja, nós somos a presença que queremos. Um para o outro, escrevendo o
diário, com tinta transparente, em letras de uma língua desconhecida.
dc
terça-feira, 28 de maio de 2024
A voz da memória
Há memórias que lentamente se
vão esvaindo, ao longo da vida. Vão-se transformando em resumos cada vez mais
curtos e longínquos. Essas memórias, construidas, nas mais diversas
circunstâncias da vida, feitas de momentos alegria e felicidade, desenhados e
escritos na mente, com imagens, desejos e vontades. Todas elas, trazem algo de
precioso, que em algum momento tentamos reviver. Uma paisagem, uma flor, uma
brisa, um lugar à beira-mar, um passeio pela mata, um melro negro de bico
amarelo, um peixe vermelho, a revolução com cravos, a luta contra os diabos, o
amor na revolução, os olhos comunicando, um beijo com paixão, um abraço, as
falas havidas, a criança que nasce, o primeiro choro; os cheiros, ah… esses tão
difíceis de cativar na memória. E por fim, a voz, por de mais escutada, que se
sobressai entre todos os ruídos e nos afasta da cegueira do esquecimento.
Quando o som da sua voz chegou, não ouvi, escutei, com todo o meu corpo, e todas
as memórias regressaram, e recolocaram-me no mesmo sentir. Não me lembro bem do
que conversamos, estava somente atento às memórias que se iam redefinindo,
trazidas naquele momento à superfície. Findo o telefonema, olhei para aquele objecto tecnológico, e pensei, afinal, há memórias que se podem reciclar.
Tiramos-lhe, os agravos e desacertos, e tornam-se mais leves e agradáveis, até se
lhes pode acrescentar mais esta, que agora se escreve, ao arquivo central, das
emoções.
dc
domingo, 31 de março de 2024
Quando nos olhamos ao espelho
Olhava o espelho, como a Rainha Má da Fábula da Branca de Neve: “Espelho, espelho meu, existe alguém mais “velho” do que eu?”. A frase vem-nos à mente, quando nos observamos a envelhecer. Olhamos o espelho e não vemos as rugas, nem as pregas da carne espalhadas no corpo. Ou, porque a luz é insuficiente, ou os nossos olhos só enxergam o que sentimos por dentro. A idade é uma marca de calendário, que o corpo assume, mas dentro de nós, está muito aquém da outra realidade, que é a forma como vivemos os dias. Quando alguém nos pretende fotografar, fugimos da objectiva recorrendo a diversos estratagemas. Pensamos: não vai captar o nosso melhor lado; não usa uma luz adequada, vai evidenciar as marcas no rosto; apanhou-me perto de mais, não trazia a melhor roupa, hoje não era o meu dia, e por aí vai, de modo indeterminado. É-nos difícil aceitar, que o nosso corpo, normalmente, não obedece a quem o sustenta, vai acontecendo de adaptação, em adaptação, à natureza da vida. Ao andar nas ruas, não nos apercebemos do tamanho e da rapidez das nossas passadas, só quando nos cruzamos com alguém, verificamos que são mais lentas e mais curtas, de que a nossa mente nos sugere. Ficamos com a ideia de que essas pessoas andam, num corre, corre, exaustivo. Se, por acaso, paramos junto de uma montra, ou janela, vemos reflectida uma imagem estranha, quase como se víssemos um Extraterrestre. Quem é aquele pessoa, ali reflectida? É um drama inconsciente, que nos faz olhar para além das nossas possibilidades e tropeçar na estória de engodo e engano, quando nos oferecem, o que nem em sonhos imaginaríamos.
dc
quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024
É bem possível
Olha, procura a beleza no que
vê, no entanto, sabe que na realidade dos amantes é preciso ir mais longe, mais
fundo, não se ficar na capa colorida, harmoniosa, que o fascina. A estrutura
que motiva, não é a dos ossos, ou a carne que os protege, suave, delicada,
morena ou branca, é antes a força que suporta essa morfologia, o seu carácter, a
sua bondade, a disponibilidade de partilhar, o modo de ver o mundo e os humanos
que o compõem, sociabilidade e sensibilidade com que vibra nas emoções, é todo
um fio condutor que une todas as partes do ser humano, o motivo, a procura do
outro olhar. O olhar, adentrando através dos olhos, é o primeiro filtro,
depois, é a busca incessante, desse ser, que está na sombra das páginas da sua
existência visual. Na verdade, é como um filme, que à nossa frente se desenrola
no écran, e no qual nos prendemos pela figura, que não sendo a mais bela, nos
fascina como se fosse alguém que representa, como pensamos o amor. O amar funciona
assim, como aquela personagem que se desenvolve perante os nossos olhos? Ou
será que na falta de comparação próxima, esquecemos a morfologia do corpo e
ficamos presos na emoção, no significado, nos valores que expressa, na
inteligência, no poder da sua personalidade, que naquele instante fala
connosco, como se fôssemos senhores do mesmo espaço e forma de estar? É bem
possível, que sem pensar, a personagem com que nos deparamos, seja de tal modo
fascinante, que nos leva a criar confusões, entre o que nos emociona e motiva e
a realidade que procuramos. É bem possível que assim seja, ou efectivamente, a
beleza estética é só mais um argumento, para que o amor aconteça.
dc
sexta-feira, 18 de agosto de 2023
com outros olhos...
Gostaria que me visse com outros olhos, que
sem temer, se aproximasse, que desse um passo, para abrir a porta do
conhecimento de si. Que proporcionasse um diálogo, de olhos nos olhos, sem
restrições e preconceitos. Que quisesse descobrir o que os meus olhos dizem,
quem sou e o quanto posso partilhar. Até seria bem possível, que servisse de
gazua para abrir a minha caixa de emoções, há muito fechada, dela trouxesse à
luz do dia algo de diferente, menos comum, mas real e humano suficiente. Com
erros de percurso, com vitórias reduzidas, mas de algum modo vividas e
duramente conquistadas, com força capaz, para que formado o par, contribuísse
para derrubar obstáculos, libertar sentimentos, surfar na alegria e na
felicidade possível. Nada se conquista, sem derrubar o medo de errar, superar
as incertezas e confiar nas forças que nos suportam, acreditando que todos os
dias serão diferentes, com tempestade e bonança, com frio e calor, com tristeza
e alegria, mas, sempre com confiança, de que juntos somos mais fortes, para
superar e alimentar o amor, que o sorriso ilumina, os olhos denunciam e o beijo
acalenta.
dc
sábado, 22 de julho de 2023
Volta logo, fazes-me falta!
Acordei abraçando a outra almofada, onde a sua cabeça, por norma, repousa. Um sentimento se instalou; de ausência, de falta, mais profundo que o corpo físico. Uma saudade que resta, uma memória que não se apaga. O próprio colchão, tem a marca do teu corpo, e do teu perfume, esse, parece que impregnou tudo o que existe no quarto, ou será que ele resta em mim, na memória? Não sei, tudo se torna estranho. Quando partes, mesmo agora, que saíste temporariamente, instala-se um longo silêncio, mas pior, o vazio de ti. Volta logo, fazes-me falta.
dc
terça-feira, 24 de janeiro de 2023
A memória do beijo
Reconheci aquela voz, surgida do nada, lá de longe, percorrendo centenas de quilómetros, naquela linha invisível que atravessa o ar, sem mudança das nuances que a tornam única. Chegou trazendo com ela memórias, emoções, sentimentos que pareciam já ter sido diluídos, nas insónias, nos dias de vazio, na metamorfose do envelhecimento. O som saído da sua boca, continuava quente, num tom que acarinha cada palavra que pronuncia, como acariciando os meus ouvidos. Tomei-me de pavor, o meu cérebro não visualizava, nem discernia na escuta, os contornos da sua boca, o seu sabor, a textura dos seus lábios, a sua humidade, nem se em cada beijo outrora dado, a língua se insinuava entre os lábios. O tempo mostrava, que a memória do beijo é mais difícil de explicar e de memorizar. O silêncio, o afastamento, a ausência de outras estórias, as noites e dias com a crueza da sobrevivência, foram afastando das memórias, a materialização do teu sabor em mim. Depois de a ouvir, reflecti e pensei, que só repetindo o beijo, o gesto, a atitude, a razão de ele acontecer, poderia fazer regressar todas essas sensações e saber quanto vale um recomeço.
dc
terça-feira, 15 de novembro de 2022
Sem seguir o rebanho
A voz se perdeu, especialistas
consultados, não lhe encontram solução. Dizem as más-línguas, que são as falas
guardadas, as desculpas não expressas, os remorsos, a depressão, as dores não
explicitadas toda uma série disparada de motivos. Adivinham-se médicos, das
maleitas dos outros, como se treinados pela experiência da cura das suas. Não
entendem a natureza humana, da perda da vitalidade do corpo, do cansaço do uso,
do arrastar das memórias, da pressão dos dias e da vivência. Filósofos da vida
alheia, de uma penada, dão sugestões de cura, opinando, como agora é comum
fazer-se, mesmo desconhecendo, ou investigando sobre. Felizmente, que a
persistência, o acreditar que a mudança, ainda tem espaço para acontecer, que
não existem limites para o sonho, para os projectos e realizações, que se sobrepõem
ao cansaço das vozes dissonantes e patéticas de figuras do nada.
dc
sexta-feira, 24 de junho de 2022
Meia palavra basta
Somos seres insatisfeitos. Quando
atingimos um objectivo, para o qual lutamos tempo infindo, não temos capacidade
para o viver, retro alimentar, sustentar, para que não seja descartado à
primeira contrariedade. O objecto de desejo, após satisfeito, logo perde
importância e partimos para outro, esquecendo que é necessário entender a
dialéctica subjacente ao relacionamento humano. Os relacionamentos e as
vivências são construidos com altos e baixos, com vitórias e derrotas, com
emoções negativas e positivas, e, periodicamente, no surgir de momentos
criativos, felizes, bordados de alegria e bem-estar. Necessário é, entender que
a vida não é um mar de rosas, antes uma rede de acontecimentos, onde é preciso
ter paciência, para enfrentar a queda, força para se reerguer e retomar o
caminho, mesmo que os joelhos ainda estejam esmurrados e a escorrer sangue. Não
há lugar para a lamecha, ou perda de tempo. É urgente saber coser com sabedoria,
os rasgões, alisar o tecido comum que nos une, e vestirmos um novo fato, mais
elástico, mais resistente e mais sólido. Para bom entendedor, meia palavra basta.
dc
terça-feira, 14 de junho de 2022
Despedida
Sabes, meu bem, era bom ouvir, chamares-me de amor. Infelizmente, nunca ajustaste a vocalização às frases e emoções certas, acima de tudo, às atitudes. Se assim fosse, talvez acreditasse, que valeria a pena continuar. Não foi o caso, e como também sabes, caminhos paralelos, nem no infinito se encontram. Na caminhada longa, que se me propunha, subjacente à palavra, não poderia perder o meu tempo, nem despender energias, que poderiam ser mais úteis, para a descoberta e concretização do meu objectivo. Encontrar o tal, alguém, que faz bem, o que deve ser feito, e encontrar a alegria e uma parte da felicidade, que a todos, o Universo tem para dar. É bem possível que nunca tenhas reparado, mas eu gosto de estórias de amor, que tenham aquelas declarações, mesmo que piegas, que emocionam e deixam lágrimas nos olhos, que projectam eternidades e heranças positivas. Daí, não nos acomodemos, façamos então o que deve ser feito, deixemos de lado o mapa, que não foi desenhado para a caminhada das nossas vidas. Só assim, outro corpo, outra inteligência, cheiros, saberes, risos e lágrimas, chegarão até nós, semeando existência e humanidade necessárias ao caminho de cada um. Foi bom conhecer-te, foi bom aprender e descobrir nesta nossa experiência, que a amizade existe, mas o amor, que se sonha e quer, é uma outra coisa, que se adentra em nós e nem sempre as palavras explicam.
dc
terça-feira, 7 de junho de 2022
Mãos e seu fascínio
Só
ficavam os olhos, cor de céu, encimando o rosto, e um cabelo, agitado, de cor
clara. O restante do rosto desaparecia debaixo do azul da máscara. Estávamos os
dois num gabinete, iluminado o suficiente, para sugerir um espaço reservado. As
perguntas tornaram-se presentes e o diálogo se estabeleceu, de forma higiénica,
cumprindo com a minha razão de ali estar. As perguntas surgiam e a minha
resposta era prolixa, como se quisesse alongar o tempo para poder observá-la.
Estranha a forma como ela continuava escrevendo registando o meu depoimento, de
cabeça levantada, os olhos me observando e os dedos se agitando sobre o teclado
do computador. De vez em quando, ela questionava de forma simples e levava-me a
desenvolver o meu discurso. Eu perdia a atenção para o que dizia, olhando os
dedos da mão dela, movendo-se com rapidez, quase aflorando as teclas. Dedos
esguios, compridos, aveludados, belamente desenhados, como se os delimitassem
uma só linha sinuosa. A certo momento, não resisti, quebrando as regras do
protocolo profissional, disse-lhe: as suas mãos são muito bonitas! Naquele
momento, eu misturei diferentes sentimentos e interpretações, fiquei de forma
insólita abstraído do tempo real.
“
O espaço se torna vazio, o ruído de fundo esmorece...só mãos, como se estas nascessem com o saber das
emoções.”
Poderia ter~lhe dito, o quanto elas eram belas e fascinantes, só o receio,
de que a voz traísse o meu empolgamento, me levou a usar o corriqueiro: bonitas
mãos!
“Tantas vezes mãos prelúdio de uma
música maior, seguindo a pauta de
um amor que se descobre. Tantas vezes mãos sustento de um amor maior, no caminho sereno dos
dias...”
dc
Texto em itálico do blogue: http://escrifalar.blogspot.com/2017/02/maos-se-tocam.html
sexta-feira, 22 de abril de 2022
Amar tem isso
Não, não importa que os teus lábios pousem nos meus, como que breves, num sopro de despedida para os sonhos. É um gesto de amor, dizendo, sem palavras, eu estou aqui. Isso é tão suficiente, que fico plena, confiante com o que representa. Amar tem isso, fazer que o simples tenha sentido. A leveza e a graciosidade do voo da borboleta, não lhe tira o colorido e a beleza. Somos assim, amantes, fervorosamente sentindo nas pequenas coisas, a amplitude da totalidade.
dc
terça-feira, 12 de abril de 2022
Não lhe dói envelhecer
Não lhe dói envelhecer, dói-lhe que o amor tenha falhado, quando mais queria que ele acontecesse. Tanta foi a procura, tantos os erros cometidos, que se foi a oportunidade de ele ser, ou de saber, ou até se aperceber, se alguma vez ele rondou a sua porta. É possível que na ânsia de o encontrar, se lhe tenha ausentado a capacidade de discernir quando ele estava a acontecer. Houve momentos, que ele quis florescer, mas, uma ou outra razão, o fez recuar, e assim, foi perdida a oportunidade que merecia. Uma coisa que ele sabe, a sua força e o quanto ele nos abala. Em cada recuo, houve sempre uma dor fininha que se adentrou, tão fundo, que tornou cada vez mais difícil abrir a porta para ele entrar, mesmo tendo consciência do quanto seria desejado e bem-vindo.
dc
sexta-feira, 7 de janeiro de 2022
Pensamento fora da caixa(?)
Eu jogo com os silêncios de cada um, que sob as gargalhadas se escondem, os silêncios fazem parte do meu universo. Hoje são as festividades de um dia, que vibra como único na imensidão dos que dominam o ano.
Eu próprio, sento-me a um canto da sala, vendo toda aquela agitação, como se fosse um filme desenrolando aos meus olhos. Enquanto isso, observo numa das mesas da sala, aquela criança nas palhas, deitada, no meio do presépio, e penso nos milhões de crianças que em todo o mundo, estão longe de ter uma vida feliz e sem os seus mais elementares direitos satisfeitos*. Nós os outros, os adultos, brincamos às prendas, comemos e bebemos por um ano e dizemos, como verdade absoluta, que o Natal é sempre que o homem quiser, mesmo com a consciência de termos a liberdade presa por um fio, chamado teste e um passaporte digital sanitário. Vivemos o mito de que a "ordem social" nos beneficia e nos cuida, tememos pensar e aceitamos que outros tomem decisões como se fossem nossas.
Estamos naquele marasmo em que todos evitamos conhecer a verdade que está à frente do nariz. Temos vindo a ser educados, há largos anos para a obediência, ao governo, aos patrões, às instituições corporativas, aos desígnios do marketing e a pensar que ser livre é ter coisas, e que a tecnologia é panaceia para as ausências várias que nos vão tomando. Moldam-nos nas escolas e universidades, com avaliações tecnocratas, para no fim, sermos bons no trabalho a defendermos o individualismo egoísta, seja num trabalho precário, ou atingir uma categoria profissional. Levam-nos a sustentar lutas entre nós, para chegar a um objectivo, como se tudo fosse permitido. Morder se necessário a canela do que está à frente, mentir, forjar situações para conseguirmos um lugar, em qualquer das actividades que tenhamos que desempenhar. Este é o mundo que nos querem aplicar como normal. No meio de tudo isto, sempre aparecerão uns bacocos, sejam eles governantes, ou fazedores de opinião, que repetirão o estribilho, de que os tempos são outros, que temos de nos habituar; do mesmo modo que nos dizem sobre a nossa forma de educarmos os nossos filhos, como se pais que somos, vivêssemos em sociedades diferentes. Esta sugestão de nova normalidade, é a tentativa de formar escravos modernos, obedientes, onde não existam laivos de resistência e revolta. Natal não é sempre que um homem quiser, sê-lo-á. quando tomarmos as rédeas da nossa vida colectiva e mandarmos à merda, alguns poucos, que definem o que devemos ser.
dc
* A verdade é crua, mostra-nos pelos números a hipocrisia.
5
crianças morrem no mundo a cada minuto por desnutrição
16 outubro 2018, 17:46
Save the Children lança uma campanha de conscientização.
Todos os dias no mundo, 7.000 crianças menores de cinco anos morrem de causas
relacionadas à desnutrição, cinco a cada minuto. Save the Children lança a
campanha global "Até o último"
Vaticano News
portallucykerr@gmail.com
"O Direito à Alimentação" Cerca de 16 mil crianças morrem de fome a cada dia no mundo
O Dia Mundial da Alimentação é celebrado no dia 16 de outubro de cada ano para comemorar a criação em 1945 da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).
O objetivo deste dia é conscientizar o conjunto da humanidade sobre a difícil situação que enfrentam as pessoas que passam fome e estão desnutridas, e promover em todo o mundo a participação da população na luta contra a fome. Todos os anos mais de 150 países celebram este evento.
Durante o Dia Mundial da Alimentação, celebrado pela primeira vez em 1981, ressalta-se cada ano um tema em que se focalizam todas as atividades. Este ano o temo escolhido é “ O Direito à Alimentação”.
Cerca de 14% da população mundial sofre de fome ou insegurança alimentar, o termo usado pela FAO (Agência para a Alimentação e Agricultura) para caracterizar a falta de acesso a alimentos suficientes para a vida, a subsistência e a saúde.
Em cada dia que passa, cerca de 16 mil crianças com menos de cinco anos morrem por fome ou problemas a esta associados. Isto apesar da agricultura estar produzir 17% mais de calorias por pessoa, por comparação ao que produzia há três décadas, e mesmo tendo em conta que a população mundial aumentou 70% nesse período.
A FAO reúne-se, esta terça-feira, em Roma, em assembleia plenária, para, mais uma vez, discutir o problema da fome.