Eles não sabiam, também não
haveria como saber, que dentro, sentia um vazio enorme, que a afastava das
pessoas e marcava o rosto, fechando-o, numa espécie de indiferença, que não
procurava. Tantas vezes tentou abrir-se num sorriso, ou expressar-se em falas
alegres, ou pelo menos, assertivas, sem que isso lhe fosse possível. Os cantos da
boca apontados para baixo, marcavam a sua expressão e transformavam a
fisionomia do seu rosto. A sua aparência exterior, estava aquém daquele vazio que
a preenchia. Não sabia como isso acontecera, nem sempre fora assim. Em tempos
fora disputada por amigos e colegas, como companhia divertida, seja na mesa do
restaurante, no café, em festas, férias, ou de tertúlias várias, em conversa e
debate, fosse de política, ou outras actividades sociais e culturais. O que
morrera em si, o que fora que adentrado no seu âmago, tirara-lhe a razão, até
de comunicar. Não, não era um “retrato de boa rapariga”, sossegada, que procurava
nos silêncios que a dominavam, como uma forma de estar, no meio do outros, isso
ela sabia que não. Algo mais profundo aterrador, a submergia, num contínuo de
instabilidade e insegurança. Sem a percepção, da razão do surgir das lágrimas,
de forma extemporânea, dando lugar a um choro convulso arrasando todo o equilibrio
interior. Sentia que cada vez era mais difícil. Quanto mais se fechava, mais
longe ficava, de tudo que à sua volta existia, menos vontade de participar no
que a envolvia.
Era sua preferência,
fechar-se no seu mundo. Sentava-se numa esplanada, junto ao mar, cuja força e
imensidão serviam de calmante. Assim, se ia distraindo, ouvindo as várias conversas
que chegavam coadas pela brisa, ou observando as pessoas que circulavam à sua
frente, lenta ou apressadamente e, em especial, os rostos que reflectiam muito
do que as movia. Ouvindo e vendo tudo, sem filtro, nem julgamento, enquanto as
gaivotas com os seus voos acrobáticos, sobre as águas a distraiam de tal modo
que a convocavam para os seus voos aleatórios, em que as emoções se esmoreciam levando-a
à sonolência. Em algumas, dessas ocasiões, tentava descobrir, donde tinha
surgido tudo o que agora acontecia consigo, mas era tarefa difícil e enfadonha,
recuar no tempo, vivendo e remoendo o passado, para saber deste presente. Era tarefa
inglória, há coisas que acontecem fruto de circunstâncias, das quais é difícil
discernir, qual a que despoletou tudo o que a abalava. Seria a mesma questão de
procurar saber, o que surgiu primeiro, se o ovo se a galinha. Certo. Certo, é
que cada dia que passava, se assenhorava de si a vontade, de se livrar de tudo
o que a manietava, ser dona de si, e menos do mundo e das regras que lhe
queriam impor de fora. Liberdade de querer ser quem era, com defeitos,
insucessos, acertos e desacertos, virtudes ou não. Afinal, só quero ser.
dc