domingo, 4 de março de 2018

Droga "dura" este amar




Sabes, tenho de confessar, não sei o que hei-de fazer quanto a nós, ou melhor dizendo, quanto a mim. Li imenso sobre autoestima, pedi conselhos, falei com psicólogo e li muito tentando perceber. Os meus amigos mais chegados, estarão certamente cansados de serem ombro das minhas angústias, das minhas queixas dolorosas, dos meus choros pela tua falta, de manifestar-lhes o meu desejo de que  fosses o pai dos meus filhos, se os viesse a ter. Eles próprios, meus amigos, sem saberem muito bem o que fariam em caso semelhante.
Fiz um levantamento das incompatibilidades, das coisas comuns, do que nos une e desune, dos afectos, da razão que me liga a ti. Procurava descobrir as razões porque te afastavas, pois tenho a sensação de que te aproximas conforme as tuas necessidades físicas, ou quando te sentes perdido e isolado dos demais, ou ainda quando tens tempo livre. Por vezes penso, que avaliando tudo, com a distância necessária, não deveria sentir-me assim. Na realidade nada explica este registo de ti, que não sai dentro de mim. Chamam-lhe apego, dependência, uma série de termos justificados, dos quais não consigo encontrar, no meio de tudo, o passo certo para que mude e possa reformular tudo aquilo que são os meus afectos, a minha própria personalidade, que se recente, como toda a minha actividade social profissional e familiar. Imensas vezes estaciono o carro em lugar sossegado e dou largas ao choro atenuando a dor que me consome. Dizem que o amor não se explica e surge de forma inesperada, que não se deve formular opinião racional sobre ele. No entanto tenho para mim – e não sigo o conselho – que o amor não pode trazer para dentro de nós esta dor que nos transtorna e anula a capacidade de raciocínio inteligente e adequado. És como uma droga dura que lentamente se foi introduzindo no sangue, alimentando ilusões e dependência, que sem ti, sinto-me com ressaca, sem ter encontrado a metadona psicológica, ou o centro de recuperação apego-dependente capaz de me tirar-te do sangue.
Tento imaginar o meu mundo sem ti, reformular a vida seguindo outros passos. Procuro incessantemente, nesse mesmo espírito, de que o amor é inesperado, preparar-me para estar aberta ao surgir de uma nova oportunidade, de eu partir para algo melhor e superior  que não este abuso sentimental, mental, físico e irracional que ainda está presente em mim. Terei de recuperar o meu eu.

dc


quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Fevereiro 2018





Acordei a pensar que este mês era o ideal para poupanças, quando dei por mim estava a fazer contas e a constatar como estava enganado. O mês mais pequeno do calendário, que deveria ser aquele em que melhor se adaptaria o dinheiro aos gastos diários, afinal é um logro. A ideia da poupança foi engolida rapidamente por motivos vários, entre os quais a criação de dias especiais como Carnaval, o Dia dos Namorados, Dia Mundial da Luta Contra o Cancro, Dia Internacional da Criança com Cancro, já sem falar duns quantos que existem para cada dia do mês, como o Dia do Engolidor de Espadas, que não percebi a razão da sua importância (possivelmente correm o risco de se cortarem e não terem seguro). De todos esses dias de gasto, os dois primeiros são os de maior despesa. Por isso, voltamos ao mesmo problema que sempre aflige as pessoas “sobra mês e falta dinheiro”, como em todos os outros meses do ano.
Faz-me confusão, e fico a pensar quem inventou estas merdas, que da maior felicidade e alegria do Carnaval e dos Namorados, se passe para a maior tristeza e dor de alma dos doentes contra o cancro. Será que somos só nós os portugas os masoquistas, que criamos todos estes dias especiais e intermitentes, para que nunca nos possamos esquecer de que a felicidade tem um tempo curto de existência...

dc



quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Se as Árvores tivessem voz





Vejo-as de braços erguidos rasgando o ar em direcção ao céu. Atento nos seus nós, que marcam datas de vida e momentos, Quase lhes sinto a seiva circulando. Penso-as vivas e sensíveis às interferências do terreno que as suporta, do ambiente que as comporta. Nos seus milhares de galhos, todos intrincados, desgrenhados, crescendo de forma variada, sem folhas, ou carregados delas, sempre nos dando sombra, frescura, protecção e melhorando o ar que nos rodeia. As árvores mostram uma complexidade, numa única vida, comprável à estrutura social dos humanos.
Se as Árvores tivessem voz, falariam das diferentes estações do ano, dos diferentes golpes que sofreram para que pudessem crescer. Explicariam a sua militância como vigilantes de protecção do ambiente, da sua função de travar os ventos, de como as suas folhas servem o revitalizar do solo. Talvez nos dissessem dos pássaros e seus ninhos. Apontariam facilmente os incendiários que as aniquilam e as transformam em carvão, ou pasta para papel. Teriam opinião sobre os golpes dos lenhadores, da sua  cantilena em voz sonora, que activa de forma enérgica o seu esforço num misto de alegria e tristeza do derrube, em contraponto com essas máquinas sofisticadas, que agora se usam, e facilmente as abatem, sem quase se lhe apercebam o choro. Fariam um relato real das muitas companheiras abatidas, para servirem um bem maior junto dos humanos, daquelas que indiscriminadamente são abatidas no amazonas, e doutras para que o betão possa crescer. Se elas tivessem voz diriam das muitas estórias que presenciaram, e de algumas que sentiram na sua pele, ao marcarem-nas com desenhos, feitos com objectos cortantes, por namorados, amigos e diletantes, como registo dos seus desejos. De quantas vezes foram companheiras de silêncios desesperados, de desassossegos, de confidências, com que muitos passeando entre elas, vão desfiando em voz inaudível. As árvores fazem perceber um pouco a razão do meditar, quando no seu silêncio nos acompanham.
Olho-as, vivo-as, choro-as. Encantam-me com a sua beleza quando as observo, não me canso de as olhar, com olhos de ver, e de sentir que elas são diferentes todos os dias e são companheiras imprescindíveis neste passear da natureza e da vida. Gosto de apreciar a forma como rasgam os céus, como sussurram com os ventos, como nos acobertam. Aproxima-se a Primavera e elas novamente trazem cor e alegria ao ambiente, com os seus rebentos e flores que convidam ao sorriso, à corrida pelos campos à alegria de estarmos vivos.

dc


terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

14 de Fevereiro




Dia dos namorados
uns livres outros caçados
alguns poucos apaixonados
outros tantos acomodados

Dia dos namorados
rosas, jantares e bombons
alguns beijos delicados
e alguns apertos dos bons

Dia dos namorados
nas prendas lindinhas
corações e flores bordados
em embalagens com fitinhas

Dia dos namorados
tudo por boa razão
comerciantes governados
em negócio do coração

Dia dos namorados
será que é uma boa ideia
sempre a ser levados
pelo canto da sereia

Dia dos namorados
será quando se quiser
corações apaixonados
sem data para o fazer.

dc



sábado, 10 de fevereiro de 2018

A vida não é um Carnaval





De que vale a vida se não tens sonhos
De que vale a vida se os teus dias são bisonhos
De que vale a vida se a dor sempre é presente
De que vale a vida se a tua alma não sente
De que vale a vida se não sabes o quanto é bela
De que vale a vida se não dás pelo calor dela
De que vale a vida se o amor não te aconchega
De que vale a vida se não te perdes por quem amas
De que vale a vida se a tua existência se apequena

Nas interrogações que tornas presentes
Nas emoções que todos os dias sentes
Nas palavras que escreves no diário
Nas frases que compões sem dicionário
Nas horas que deixas correr pelos dias
Nas ausências que descreves sem alegrias
Nas vivências que sentes cheias de vazio
Nas noites em que adentra em ti o frio
Nas mentiras em que te escondes
Nas verdades que te trazem a dor e o medo
Nas realidades a que te fechas como dum segredo

E se te agarrasses ao tempo que te foi dado
E se te prendesses à vida mesmo que abandonado?
E te deixasses de lamúrias e te descobrisses
E te deixasses de apego a esse amor acabado?
E se caminhasses nesse novo percurso sem bússola
E se deixasses que o norte te encontrasse?
Talvez a paz dentro de ti entrasse e a dor acabasse

A vida não é um Carnaval de música e galhofa
A vida não tem fatos feitos à tua medida
A vida flui e umas vezes ela de ti mofa
Outras vezes ela só pede para ser vivida


dc