segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Na verdade...



..., já não esperava muito mais, o que deveria acontecer nunca chegou a acontecer, ficaram-se pela troca de fluídos e deixaram morrer tudo o resto que poderia nascer. Refrearam-se nas vontades, quando ao que se seguiria, com medo de perder não se sabe o quê, como se viver e amar fosse uma questão de perder poder.
Quem tem medo de perder nunca se aperceberá do quanto poderá ganhar. No acertar e errar se avança, se descobre, se evolui. Nas dores se constrói a força de resistir, de sobreviver, solidariedade, partilha, solidez no que surge de novo.
Fizeram as escolhas, erradas ou não, só mais tarde se avaliará, na realidade nada mais avançaram. Cada um por si, se pretendia mais livre e, assim foram esbracejando, como afogados, tentando sobreviver não sabendo ao quê. Afastaram-se cada vez mais, e ainda hoje, cada um por si, procura explicações cármicas para o acontecido. Resta agora, a cada um, ter a seu lado páginas de solidão, dias continuos de silêncios, um vozear de palavras que não têm escuta, emoções que não recebem retorno.
Quem não se prepara para oportunidade, quando ela surge, pode ficar eternamente esperando, talvez de que tudo seja perfeito, esquecendo-se que são humanos.

dc

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Quando o dia nasce



Descarregou a noite no disco rígido dos dias, como se quisesse manter eternamente guardada a escuridão, preservando o dia. A noite trazia-lhe os cansaços, as tristezas, a vida com seus embaraços, os ruídos nitidos, vigorosos, como todos os sons na calada da noite, tudo isto preso a uma certeza que se fundia com o pior das memórias.
Prendia os olhos no monitor, a sua luz referenciava o espaço em volta, assim se deixava ir agarrando palavras, imagens e estórias que se confundiam com as que ía inventando. Não se queria preso às paredes manchadas de figuras fantasmagóricas, que conformavam o habitáculo. Fugia, mantendo-se no mesmo lugar, alimentando a falsa ideia de que tudo mudava, para que o dia chegasse mais depressa.

Já houve um tempo, em que as noites se preenchiam em volta de uma mesa, em tertúlias de amigos, vivas e participadas, que acabavam pela madrugada sentados na borda de um qualquer passeio das ruas da cidade, Houve outras, que decorriam na observação do luar iluminando a terra, onde o seu silêncio só era interrompido com as vozes sussurradas no amor, que se fazia debaixo das estrelas correndo o céu.

Anseia que o dia chegue, trazendo-lhe o céu azul, a luz do sol afastando-o das paredes fechadas de penumbra, a brisa beijando-lhe a face e o ruído das vozes indistintas, coladas ao trinar dos pássaros, que enchem o ar. Nesse momento se rejuvenesce e tudo tem outro sentido. E volta a esperança de que o seu rosto surja a qualquer momento de entre um virar do dia. Não que a realidade não seja crua, por vezes, até as nuvens cinzentas perturbam, mas é muito mais visível e sem fantasmas. Vê o amigo e o inimigo, percebe o mexer dos lábios com as palavras que deles saem, olha nos olhos e lê as pessoas, Sente o prazer da leitura, na esplanada de um qualquer café, ou o prazer de um passeio à beira mar. Sente o mundo com a cor e brilho que a noite não possui. É a paz entrando em si, como o soro no sangue ajudando a superar a doença, Por isso, quando o dia nasce, a vida acontece.

dc

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Observo...



....na imagem partida, parte da minha vida se esconde entre as linhas que limitam o que sou. Agarro-me com força, a este meu pensar, não quero muito mais revelar, deixar que se saiba das minhas tristezas, das minhas loucuras, dos meus amores perdidos, das minhas cicatrizes. Sirvo-me do que vejo para me avaliar e não para que outros me possam julgar. Esta a minha melhor forma de criar limites próprios, não só perante quem nada sou, mas mesmo para com os que de perto me vão descobrindo.


dc

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Se não sais de ti





"Se não sais de ti, não chegas a saber quem és."
 José Saramago


Determinas o espaço
Do tempo escasso
Que te sobeja
Assim queres que seja

Fechas a porta
Sem olhar para trás
E esperas que não fuja
E que aguarde por ti

Se não sais de ti,
Se me dás o que te sobra
O tempo não se desdobra
E fico sem saber quem és.



dc

Mãos se tocam



Quando as mãos se tocam, os dedos se enlaçam, o arrepio entra na pele para dentro de nós, tudo se desmorona, tudo se esquece, as faces tornam-se róseas, os olhos se dizem em seu brilho, os corpos comunicam sem palavras e se elanguescem. O tempo não existe, é uma acontecer sem idade, sem lugar. O espaço se torna vazio, o ruído de fundo esmorece...só mãos, como se estas nascessem com o saber das emoções.
Tantas vezes, mãos, prelúdio de uma música maior, seguindo a pauta de um amor que se descobre. Tantas vezes, mãos sustento de um amor maior, no caminho sereno dos dias...
Quando voltares, para caminhar ao meu lado, não te esqueças que as tuas mãos me desenharam arabescos na pele, antes de sentir o calor dos teus lábios, antes mesmo de te amar por inteiro...


dc