segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Chapéus há muitos



Sobre a cabeça inclinada, tinha colocado um chapéu de cor clara, que lhe tapava grande parte do rosto, lobrigando-se o queixo saliente, e umas pequenas rugas em volta da boca. Aquela figura aparecera-lhe de repente do nada. Ele temia ver mais do que se via, temia encará-la se ela se revelasse totalmente. Possivelmente não seria o rosto que a sua mente mantinha vivo, e nos olhos provavelmente encontraria ambiguidade, indiferença ironia, omissão e porque não mesmo, mentira? Melhor seria não levantar o chapéu, assim tudo ficaria como antes, mantendo uma ideia positiva de alguém, que outrora, fizera parte do seu mundo de emoções. Quem sabe, se usar o chapéu não fora um modo inteligente de criar suspense, de fugir ao olhar do outro, assim sempre evitava que se percebesse que as palavras não casavam com o olhar. Talvez uma espécie de silêncio, uma forma diferente de chamar a atenção sobre si; “reparem no chapéu, no meu corpo, e esqueçam o que meus olhos dizem, ou o que sinto”, assim tudo se tornaria mais fácil, “chapéus há muitos”.

dc


sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Os anos correm




Os anos correm
As pessoas correm
As mortes ocorrem

Nos anos que correm
O tempo é dinheiro
E muitos morrem
Sem encher o mealheiro

Todos festejamos
Um aniversário que passa
Assim nos enganamos
No envelhecer sem graça

Melhor seria viver o dia
Sem contar o tempo ao segundo
Gozando tudo com a alegria
De ainda estar neste mundo


dc

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Conto do Vigário




A mentira vem com momentos inesquecíveis, verdades indesmentíveis, realidades intransmissíveis, chiça até fico baralhado com argumentação tão forte, tão valorosa, tão In, ou Out? Não percebo muito da linguagem psicológica e mitomaníaca, tanta informação deixa-me inibido, incapaz de dizer ou escrever refutando. Sim, é tanta a firmeza das suas convicções, que não sabe sequer das convicções de tal firmeza, tal o ímpeto, na vontade de afirmação e convicção da sua mentira, ou será realidade? É tão confuso para quem do lado escuta, que fica sempre na dúvida perante o vigário filho da puta. Então ele próprio, nesse encantamento de verdades, ou mentiras, comporta-se como um jumento e aceita todas as cantigas, ao ritmo de quem as emite e mente deliberadamente, pondo-se em causa; será verdade realmente?


dc

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Chão frio de nada




Fiquei preso nas muralhas que inventaste para que eu me afastasse, porque temias que tudo fosse mais além, de que um mero encontro de beijos e abraços. Os muros altos do narcisismo, da grandeza outrora vivida, traziam-te pretensões maiores que o alcance do momento. Como muitas procuras que se pretendem, por não entendimento do viver, morrem na praia sem se encontrarem, fica somente o vazio de uma luta perdida. O que tinhas na mão, se foi em voo rasante até atingir o céu sublime, e tu, agarraste o chão frio do nada.

dc

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Viajar dos dias




Quando olhei aquele chão, molhado e a luz que se reflectia na água, agarrei a imagem com o olho da máquina, para que ficasse registada fisicamente, mas muito mais dentro de mim. Era a chamada ”luz ao fundo do túnel”, de que precisava para continuar. Aquele momento aconteceu do nada, como para me lembrar, que haverá sempre uma solução para os problemas da vida, mesmo no intricado emaranhado em que ela nos coloca. Nem a chuva, nem a noite que se aproximava, me tiravam agora a esperança que vi nela. Foi como um despertar interior, uma alerta ao espirito, de que devia continuar a calcorrear aqueles paralelos, levantar a cabeça, e enfrentar os desafios que se vão plantando neste viajar dos dias.

dc




quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Lua cheia




Se na lua cheia
O amor é instante
Na lua minguante
O amor será hesitante...

Lua, minha marota
Apareces antes de anoitecer
Agitas o garoto e a garota
Tirando-lhe o adormecer

Lua que alimentas amores
Agitas todo o cão e gato
Fazes esquecer todas as dores
E falta de comida no prato

Compões a frase do poeta
Fazes uma alma suspirar
Tornas uma alma deserta
Capaz de no amor acreditar

dc