Numa pausa da minha leitura, enquanto observava a natureza que me rodeava, surge ele do nada, saltitante, feliz, sem se preocupar com as coisas comuns, de nós mortais, nos dias de hoje. A pequena cabeça parecia ter antenas, movimentando-se olhando à esquerda e direita para cima e para baixo, como se fosse movida a corrente eléctrica. A minha presença certamente trazia-lhe curiosidade e talvez temor. Aproxima-se e afasta-se com rapidez, como se tacteasse a confiança. Ele desconhecia a palavra “Pandemia”, ou quarentena, nem saberia de muitas outras que falavam de morte e dor. Só conhecia as diferentes estações do ano, o passear nas nuvens, a nidificação, os seus predadores e a procura atenta de comida no solo. Também não sabia que aquele seu pular vagabundo, com pequenos passos rápidos, faziam-me ficar atento e deliciar-me com a riqueza e a esperança que me trazia, de que o mundo é muito mais que pequenas coisas, mesmo quando carregadas de morte e frustração. A sua roupagem preta, trazia agarrada a si um amarelo vistoso, que se apagava e surgia no meio das ervas e das flores. Captar a sua imagem no visor da máquina e registá-la, era uma missão difícil, que valia como memória para mais tarde recordar. Tinha consciência que por muito bela que a imagem fosse, ou o que relatasse, a estória que contaria visualmente, seria sempre insuficiente para contar o momento de “convivência”. Daquele instante curto de comunhão (minha, pelo menos) com aquela figurinha, tinha a certeza de que a imagem ficava aquém das mil palavras e das emoções sentidas. Não era um patinho amarelo de peluche, com amêndoas da Páscoa, na montra de uma qualquer loja, era sim a vida, em ponto pequeno, manifestando-se.
dc