sábado, 31 de janeiro de 2015

O sol me abraça



Quando o dia nasce
e o sol me abraça
o dia se esclarece
e toda a minha angústia passa.

dc

domingo, 25 de janeiro de 2015

PESADELO..



A noite decorre no silêncio do quarto vazio, a febre, o corpo dorido, e a pequenez, de todos nós, perante a enfermidade que nos toma. Nesse delírio, o silêncio é feito desse exército de batidas nos tímpanos, de rios que nos molham o corpo e dos arrepios que um vento que não existe nos trás.

Ouço a voz que não existe, falando-me como se ao meu lado estivesses, sinto teu cheiro de forma nítida, o seu sorriso, e sou trespassado pelos pesadelos que se afastam ou aproximam conforme o meu corpo reage. Falas de forma agreste, afastas-me. O coração bate desordenadamente, a sobrecarga é demasiada, parece querer explodir. Lentamente tudo se esvai não chego a acordar, ouço quem não existe, falando como se estivesse presente, tudo se mistura, pesadelos atrás e pesadelos e o corpo flutuando no limbo, talvez aqui como em outros lugares, tudo se cura ou “até que a morte nos separe.”

dc

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

A ESPERA




Gostava que chegasse mais cedo
do que a minha partida.
Gostava de te poder ver e dizer
mais do que algum dia disse.
Gostava de em pouco tempo viver
mais do que alguma vez vivi.
E se ainda por aqui fiquei e não parti
não foi por medo
Foi por ser ter a certeza de que é cedo
para me perder definitivamente de ti.

dc



domingo, 18 de janeiro de 2015

O AMOR....



O amor é um leito aconchegante que não queremos deixar mesmo por questões de sobrevivência. E quando o deixamos é como ter um par de óculos sem uma lente.

DC

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

UMA BRISA DE MUDANÇA


O frio era acentuado, mas não estava sozinha na sua caminhada, alguns de mão dada, talvez namorando as suas vidas, outros individualmente como ela, percorriam a linha marginal ao mar, que servia de repouso ao olhar. Enquanto as pernas se mexiam inconscientemente, ia pensando nas últimas decisões que tomara para a sua vida e que não tinham sido fáceis. Ali naquele lugar, na chamada época baixa, não havia a enchente dos turistas sazonais habituais. E embora se sentisse algum frio, era bastante mais quente que no norte, o sol ali era companhia diária.

Estava bastante longe do lugar de nascença, trocara o norte pelo sul do país, precisava de fazer um intervalo, ou paragem, nas rotinas que na sua terra de origem a incomodavam. A vizinhança pouco simpática, a procura de trabalho, as saídas para se distrair que não resolviam o que sentia dentro de si, a falta de partilha de algo mais sério e reconfortante, a luta diária contra o vazio que sentia dentro de si levaram-na a partir.
Ali, naquele lugar, a vida calma que levava permitia-lhe afastar-se o suficiente para se esclarecer a si própria e encontrar soluções para tomar decisões, a idade começa a marcar a urgência de encontrar um caminho mais assertivo que lhe trouxesse a alegria dos dias. Talvez até encontrar o tal príncipe encantado, quem sabe. Há quem diga “não faças planos para a vida, que ela tem planos para ti”, mas ela preferia fazer os seus.

DC

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Uma Tarde na Conversa



Raras vezes se encontram, e quando acontece, o tempo, esse enorme papão da existência, acelera o momento deixando muito por descobrir.
Tem um brilho nos olhos quase diria entre o irónico e interessado que fazem esquecer a cor que os domina, Observa como se analisasse cada partícula do que vê, como se quisesse interiorizar ou memorizar tudo, como um espião em serviço mede todos os detalhes no ambiente que o envolve.
Um olhar que se gosta porque não é neutro, motivado, expressivo, que não se esconde, até por vezes altivo, revelando confiança em si própria, ou alguém que possui um auto-estima elevada. A boca, sem ter lábios grossos e exuberantes, é bem desenhada e dela saem as palavras que melodiam com os dentes brancos e bonitos. Estes dois elementos, constituem parte relevante da construção dum rosto agradável e que dá prazer de observar. Fala em voz baixa, calma e fluente prendendo a atenção entre a visão da sua imagem e os temas que aborda. Existe nela algo perturbador e indefinido, entre o sonhador e o filosófico.
Comentavam um texto que ela escrevera e, nas falas que vão trocando, marca um discurso inteligente, sagaz sem medo ou hesitações, como se tivesses uma experiência de vida que não condiz com a idade jovem que aparenta. Com convicção defende o ponto de vista do que escreveu, não valorizando excessivamente determinados pontos do tema. Revela ambições muito próprias quanto a desafios futuros. Com facilidade saiu do tema do texto, e outros surgem com rapidez, sem se perder no excesso de palavras, contrariando um pouco o seu discurso escrito, que é prolixo, arrojado de adjectivação e no qual se sente o prazer de querer ser diferente, de encontrar uma outra linguagem e vocabulário menos comum.
A lisura da mesa do café e as chávenas são o separador natural da identidade das emoções, criando a distância necessária. Vão trocando opiniões, divergindo, condescendendo, dialogando, evidenciando projectos perdidos, encontrados, pendurados no tempo, com o mar e o sol testemunhado, para memória futura. A tarde tornara-se inesperadamente agradável e valera a pena aquele momento. Afinal dois, de sexos opostos, com idades e discursos de algum modo diferentes, conseguiram entender-se conversando largas horas. Pela primeira, vez em muito tempo, ele fora ouvinte atento falando menos, o que considerou óptimo para si. O fim do dia chegara, a noite rapidamente caíra e o frio, mesmo dentro do café, começou a acentuar-se, urgia partir. Pouco tempo depois cada um seguiu seu destino, sem saberem quando surgirá nova oportunidade para uma outra conversa.
Já no caminho de casa, lembrou-se do livro, Elogio da Conversa de
Theodore Zeldin, em que diz:
"Falar é bom! Converse! Conversar é uma forma superior de inteligência, e uma arte que se pode ensinar e aprender"
Era isso que ele também pensava e sempre esperava de uma boa conversa.

DC

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Imagens com Estórias



Olho as imagens, centenas delas, com uma estória para contar, desde a forma como foram captadas ao conteúdo. Quantas horas de fotografar; diferentes máquinas analógicas, digitais. “Chapas” atrás de “chapas” procurando diferentes enquadramentos, o melhor ângulo, a luz e sua inclinação, contra-luz, contraste, o momento, o foco, o zoom, um grande plano, aproximado, geral... A tarde decorreu entre memórias, as emoções e os cheiros que a elas se agarram. O rio, a ponte, as pontes, a diversidade das flores, as árvores no correr dos seus dias; um rosto, a multidão, a cidade num todo, a cidade em detalhes, uma cadeira perdida, uma mesa deixada; as manif várias com milhares de pessoas do 25 de Abril, os cravos, um cartaz que conta, um primeiro de Maio dia do trabalhador, as reivindicação em panos, a carestia, as mãos marcadas pelo tempo e trabalho, a criança em ombros, os reformados gritando; os jardins do museu, a arte e seus autores, a filha, o neto, sempre ele no meio de muitas, natais de família, aniversários e casamentos, carnavais, os aeroportos de chegadas e partidas, as estações do comboio, os relógios das partidas e chegadas, passageiros saindo, carruagens e reflexos, um adeus dorido, a permanência tão breve, ou distante, o corpo deitado desnudado, a roupa vestida, a roupa deixada, um resto de fim de tarde, um dia a nascer. Um mar de sul, o cenário azul, um Alentejo de calor, um outro de primavera.
Tantas imagens com estórias infindáveis, demais para que me perdesse a analisar melhor cada uma das imagens, com os seus objectivos e conteúdos...fiquei pela observação, recapitulando, reavivando seus indícios, para que se mantenham na memória, mais uns tempos. Se uma imagem vale mil palavras, hoje devo ter lido milhares de palavras....

DC