segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Tal qual...


.... marionetas, presos nas teias globalistas, vamos sendo varridos por indiferenças várias, dos muitos que se ficam no comodismo da sobrevivência, bufando, denunciando, preferindo viver macaqueados, de açaime e espaço restrito. Como se os pássaros gostassem de viver em gaiolas e não trocassem um dia de liberdade por anos de prisão. Se o ar fosse causa de morte, de que valia a pena sobreviver, com escafandro permanente, de que valia morrer de tédio no isolamento de quatro paredes, na ausência do abraço fraterno, do amor? Na verdade, tudo isto, não é algo que tenhamos procurado, mas a satisfação da vontade e ambição de alguns “homens”, mexendo na natureza das coisas que deveriam estar quietas, para se apoderarem  dos bens da terra e dos viventes. A terra sempre responde ao descuido humano protegendo-se das agressões reagindo com força dos elementos arrasando tudo e todos. Os viventes, a quem lhe sacam o sangue e a liberdade, a resposta pode ser tardia, mas surgirá com a violência inesperada, cúmulo de fúria de quem se liberta das teias e emaranhados ramos que as tentam manietar. Nada será como dantes, mas fica o aviso, ou acordamos, perecendo alguns, para que muitos sobrevivam com dignidade, ou nos transformaremos em lixo tóxico de qual todos terão nojo de cheirar e pertencer.

dc


domingo, 31 de janeiro de 2021

Vindo do pó


Acreditava que amar era como uma obra de arte, que acontece no meio de diversas experiências falhadas, entre esboços e ideias não concretizadas, na verdade, surgindo dum caldo de muitas vivências e sentimentos, dum cúmulo transformado em inspiração que sobressai em momento não previsto e se disponibiliza para o acontecimento. Do mesmo modo que haverá também quem pense, e acredite, que seja intuído pelo que dentro de nós acontece, quando pensado e imaginado vezes sem conta, sem percepção de que o fazemos, até que ele surja como se um click se desse. Seja qual for a versão, a sua descoberta, ou melhor, o seu acontecimento, traz consigo a capacidade, da tolerância para a repetição dos dias e dos hábitos, para o deixar-se ir livremente ao sabor desse sentimento e da vida de um e de outro, de um para o outro, sem tempo marcado. É um sentimento que não morre pela troca, pela ausência, pelo fim da vivência em comum, quando muito, se afasta da intensidade e muda de forma. Caso contrário teria sido um engano da sua percepção.

 

dc

 

 

 

sábado, 30 de janeiro de 2021

COISAS DA VIDA

Olhei a cara enrugada e a sua pequenez, não pude deixar de lembrar-me, como somos insignificantes quando os anos nos tomam e somos envolvidos nas teias que a sociedade nos cria. Ficamos tolhidos, encolhidos, com receio de dizer, não, e fazermos, como sempre desejávamos, o nosso caminho seja ele qual for. Assoberbados pelas despesas a que não conseguimos dar resposta, devido às péssimas condições económicas, dependendo de uma reforma precária, obtida em idade avançada, tememos o pior. Não damos um passo, sem que sejam ponderadas todas as possibilidades e os diferentes ângulos de abordagem. E assim vai, correndo o tempo, sem pudermos abrir a porta a um amor, mesmo que tardio, que poderia tornar mais leve o fim do caminho. Quando a liberdade das obrigações diárias de dezenas de anos de trabalho se esfumam, em vez de nos atirarmos à descoberta de novos mundos e vivendo os momentos de ócio como bem nos apetece, os outros, sejam eles os filhos, os netos, ou amigos, nos vêm dizer que é importante contribuir ajudando, naquilo que afinal só lhes dá jeito a eles próprios e não a nós mesmos. E depois os governantes que sempre dizem preocupar-se com os idosos, aumentam o tempo de vida a trabalhar para quando sairmos para a reforma, estarmos de pés para a cova e o dinheiro amealhado ao longo dos anos fique na mão do estado.

dc

 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Cozinhava excessos

Contrariando o ditado popular que diz há sempre um testo para uma panela, sempre escolheu com critério adequado. Não cozinhava para qualquer alguém, o seu gosto gourmet exigia uma escolha criteriosa. Era tão exigente nisso como nos utensílios, nos produtos e a sua qualidade, nas medidas certas da receita, na confecção amorosa e cuidada. Enfeitava a preceito o local de degustação, de modo harmonioso e sedutor. As suas mãos mexiam-se com delicadeza, ou firmeza conforme as exigências e usava os dedos em gesto atrevido, para experimentar num toque subtil a doçura e a espessura da massa. Na boca fazia pausa com os alimentos para deles extrair todas as nuances e sabores, movimentando língua entre o palato e os dentes, deixando-se envolver no ambiente de aromas da degustação cuidada, enquanto saboreava o delicioso néctar das melhores colheitas entre um sorriso de aconchego e um piscar de olho. Apimentava quanto possível, deixava-se ir na envolvência do momento, e banqueteava-se nas delícias afrodisíacas da receita. Sem se interrogar se tudo saíra perfeito, a resposta emocional do outro, era suficiente. Sabia cozinhar os seus excessos, para fazer a catarse das incertezas e dar azo à oportunidade de viver momentos únicos.

dc


segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Sombra do que fomos


Suspenso, sem espera, o acaso determinará quando inevitavelmente partirá. Há tanto tempo caído, ninguém irá reparar dos tempos idos onde a sua presença era bem-vinda num qualquer espaço com vida. Agora, fica-se, vazio, amarfanhado por dentro e por fora. Trapos o envolvem, trapos  são os restos da sua memória. Desgrenhado, com a pele escurecida pela intempérie, o cheiro marcando o seu lugar de passagem, diz do alheamento do passar do outro mundo paralelo, do qual já não se sente parte. Pisado, nuns casos por aqueles que lutam pela sobrevivência na luta dos dias, e noutros casos pelos que tem prazer e mesquinhez de sentirem o pisar da sola do sapato, a pobre existência dos outros. Continuará fazendo cama nos portais das casas, enjornalado, ou encartonado, afugentando o frio e entupindo passagens. Se nos campos, debaixo de algum telheiro, irá observando as águas tombando do céu sobre as terras, sabendo que o renascer possivelmente já não será o seu. A sociedade desnuda de humanidade, não chorará a sua partida. Quando definitivamente ausente, os conviventes passantes, que tapam o nariz ao vê-lo nos seus andrajos, ficarão pedindo ao céu que não regresse um outro com uma nova roupagem e outras dores que não conhecem. Alguns, poucos, de pituitária menos sensível, mas de sensibilidade apurada, ainda se preocuparão em amenizar um pouco dos seus dias, não em datas festivas, porque, humanos solidários,  sentem como suas, as lágrimas, ou o descaminho, daquela gente que algures se perdeu na caminhada e não mais encontrou rumo. As roupas velhas com que os vestem, ou a comida que lhes oferecem não resolve, nem limpa consciências, sinaliza sim que se importam, mesmo que de mãos atadas se sintam incapazes de maior impulso. Dão um sinal de que é preciso mudar as consciências. Que o momento é de aprendizagem e não de medos, tempos de avaliar o quanto somos capazes de mudar e de fazer melhores escolhas para a vida que queremos para nós e para os outros.

dc

 


domingo, 29 de novembro de 2020

Opiniões, são como os melões

 

Sinuosas, tortuosas, as mentes que sendo acomodadas na colcha da fartura, condenam, ou criticam, quem não obedece à lei da acomodação, nem quer ser pé de cama do comodismo dos outros, ou dar vantagem a quem vive sem a percepção daquilo que os outros vivem e sentem. As opiniões divergem de acordo, com o berço onde se nasce, do modo como cada se foi formando no correr dos dias, tendo em conta as circunstâncias do meio, e como alcançou os seus objectivos. Acontece que muitos sobem os degraus, com alguém pondo a mão nas costas para que não caiam ou recuem, outros sobem palmo a palmo, degrau a degrau, escorregando e caindo, sem desfalecer, para cumprir com o que se determinou conseguir, comendo a terra que o diabo amassou. Dar uma opinião sobre a fome não é a mesma coisa do que senti-la, dar opinião sobre uma doença grave e dolorosa, não significa vivê-la, quando muito se solidariza com quem sofre. Há quem tenha opinião e a defenda dentro dos princípios que invoca, com razoabilidade e conhecimento, leituras e participação na área que advoga. Há quem tenha opinião tirada de leituras “corridas”, ou de histórias sem fundamento e acha-se conhecedor suficiente de todos os factos. Infelizmente parece ser comum dar opinião, porque se acham no direito de a ter, “estamos em democracia” dizem, perante aqueles que queimaram as pestanas, ou perderam anos da sua vida, aprendendo, estudando, trabalhando arduamente. É verdade, que todos têm direito a dar a sua opinião, por intuição, emoção e o saber da experiência feita, mas também se deve pensar quando ela é só mesmo isso, opinião, por vezes desajustada, e sem sentido não contribuindo para acrescentar, mas somente procurar ganhar um ponto numa conversa, ou discussão, por vaidade, por estupidez ou inconsciência e em muitos casos de forma arrogante e ofensiva.

 

dc


sábado, 28 de novembro de 2020

Soletrar o vazio e o silêncio


Difícil foi recuperá-lo do coma amoroso e do amorfismo que se lhe seguiu. Tudo demasiado confuso para o seu cérebro, primitivo na consciência do que se passava, na dificuldade de juntar palavras ou compreender os sons das falas que em seu redor aconteciam. Faltava-lhe entendimento e capacidade de dimensionar o seu apego. Os olhos escorriam mares, nos lábios, balbuceios incoerentes repetindo sempre a mesma frase: "Foi insuficiente um amor incondicional, para quem te deixa a soletrar o vazio e o silêncio".

dc