terça-feira, 18 de setembro de 2012

+ VALe TarDE do Que NUnca


Eu estive lá e não me regozijo mais do que das muitas outras vezes que estive lá, mas fico feliz, pois como diz o povo na sua sabedoria “ mais vale tarde do que nunca”

Sempre participei livremente em manifestações, desde que na defesa do bem comum e com a consciência de que não eram voláteis os assuntos e as pessoas. Sábado verifiquei, que muita gente apareceu na manifestação marcada pela net. Lá se foram os tempos de se fazer e colar cartazes, para fazer publicidade ao evento. É de facto mais prático, não se sujam as mãos e nem há trabalho, ou seja propaganda fruto do tempo e das “modernices”. Talvez eu seja um velho do Restelo, por ainda me lembrar, quando perdíamos noites, antes e depois do 25 de Abril, para mobilizar as pessoas para a rua, com sacrifícios tais que não lembra o diabo, mas com a riqueza do companheirismo e cumplicidades inerentes à luta.

Avançando, vi de facto muito gente na baixa do Porto, o que me podia levar a perguntar onde estava esta gente quando da greve geral, quando da greve dos professores quando das manifestações que ao longo destes anos, e em especial, no último ano se têm efectuado? Se tivessem aparecido nessas outras manifestações como na de ontem, será que o país estaria a atravessar tão grave situação?

Muita gente ficou á espera que a revolta dos outros resultasse no seu benefício.

Dizia uma senhora virada para as câmaras de televisão, que nunca tinha ido a nenhuma das anteriores manifestações, mas agora... o que me lembra o poema "Indiferença"* que diz:
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
Tanta coisa tem sido posta em causa pelos sucessivos governos PS/PSD, entregando tudo o que foram conquistas de Abril, ao poder financeiro, inventando a democracia social, económica, cultural, etc.etc, quase nos fazendo acreditar que a democracia tem variantes e não é só uma.
Eu gosto de ver o povo, sem classificações de meio ricos, os mais ou menos ricos, os mais ou menos pobres, e os mais ou menos da classe média, (e a luta de classes onde fica?) mas todos aqueles que na sua individualidade constroem este pais numa democracia única no respeito por cada um e na aceitação de quem é eleito para dirigir todo um povo e não em benefício de alguns.

Não comparo esta manifestação com a “manifestação das caçarolas” do tempo do Allend(Chile), de apoio à direita que tudo fazia para derrubar o seu governo socialista legalmente eleito, em que as pretensas donas de casa que nunca o foram reclamavam, mas temos de pensar no que ela significou e quais os objectivos que se alcançaram.

Lembro-me dos Pachecos, dos Durões, dos Barretos, que se diziam em tempos de esquerda e onde estão agora? Lembro-me de alguns Primeiros, outros Presidentes, outros bombistas, que hoje comentam para a televisão e dizem estar ao lado do povo que eles traíram, nesse outro tempo, tentando assim branquear o mal que fizeram à democracia. Alguns deles foram os primeiros a darem indemnizações aos regressados do estrangeiro para onde tinham fugido a seguir ao 25 de Abril, deixando as fábricas abandonadas, muitas delas já falidas. Puderam fugir em “nome da liberdade”.

Sou dos que não acredito, que sem partidos se construa o futuro de Portugal, como também, não acredito que gritar “Oh Coelho vai para rua que esta terra não é tua”, e a seguir se batam palmas ritmadas. Há quem lhe chame Esquerda Festiva. EU chamar-lhe-ia “Indignados bem vestidos”. A malta de esquerda veste bem, mas não faz da luta uma romaria revolucionária, ou uma passagem de modelos, tal era o vestuário de um “negligé”, fresco, leve e com muito gosto, com que muita gente pavoneava e observava de fora a marcha. Não temos de andar de fato macaco, mas na verdade é preciso sentir o fato macaco.

Permitam-me que duvide das pessoas que dizem há anos não votam e não acreditam nos políticos, que no futuro próximo, ou que voltem a votar, porque nessa altura a desculpa será a de não encontrarem alternativas. Até porque de facto a alternativa está efectivamente à esquerda, e em todos os outros partidos em que eles, costumam dizer “ não se revêem”.

Acredito sim, que no meio daqueles muitos milhares presentes, dos quais muitos deles por solidariedade foram engrossar o protesto, estejam pessoas que reconhecerão, terem andado anos arredados da verdade do país esquecendo-se da ditadura fascista, e todo este percurso desde o 25 de Abril, até aos dias de hoje. Acredito que muitos outros comecem a perceber que não chega integrarem-se na “esquerda festiva”, ou serem uns "indignados", é preciso mais do que isso, só a luta organizada e a união de todos fará deste Portugal um pais melhor onde todos têm direito ao estudo, ao trabalho à saúde a acima da tudo à sua dignidade.

Tenho esperança que num futuro próximo, muitas destas pessoas serão solidárias irão para a porta das fábricas apoiar os direitos de quem trabalha, que serão solidários nas empresas, nas escolas, que se indignem com a exploração, que não critiquem as manifestações, as greves e que estarão solidários em todas as decisões que ponham em causa o bem colectivo da sociedade

Os meios de comunicação, apareceram em massa e deram uma cobertura como já não se via há muito a estes acontecimentos como se tivessem acordado agora. De facto eu nunca vi tanta quantidade de representantes dos media, digo eu agora, “desde os primórdios da revolução”. Assim como não tenho memória de ter estado numa manifestação com tantos fotógrafos amadores, com tão boas máquinas, procurando registar aquele momento único, talvez para eles.

No passado para a direita, a “esquerda pequeno -burguesa” não fazia mossa antes pelo contrário. “A esquerda festiva” ou “os indignados” , de igual modo, nos tempos de hoje também não fazem e como tal não lhe dão valor algum. O Poder económico admira muitas “esquerdas festivas” e até lhes chama democráticas, porque têm medo de qualquer força organizada. A “esquerda festiva”, reivindica tudo, só que não põe em causa a estrutura e o sistema que regem as nossas sociedades, o capitalismo.

Faço votos que me engane e todas estas pessoas que participaram na manifestação sejam consistentes e conscientes e a partir de agora estejam atentas não permitindo os abusos do poder.


Atribui-se este poema a Bertold Brecht, como a outros autores como por exemplo Martin Niemoller.

NUNCA TE TRAÍ


Parto para a manhã enevoada ao encontro da cidade e delicio-me com o algodão doce que a abraça, como se os meus desejos se tornassem realidade e meus braços se agigantassem num envolvimento de agradecimento a este ninho que me viu nascer e sempre me aconchega. PORTO ÉS A MINHA CIDADE


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

NATUREZA MORTA...HOMEM MORTO


Ele tinha os olhos brilhantes, com um ar meio esgazeado, andrajoso no vestir. O corpo projectado para a frente, em cada passada parecia querer encontrar o equilíbrio. As mãos pareciam garras com as unhas sujas e compridas, nas costas um saco daqueles de plástico pretos que se usam para o lixo, um outro tipo caqui, sebento. Nos pés as sapatilhas deixavam os dedos respirar pelos buracos da biqueira, fruto talvez do desgaste das caminhadas, ou pelo longo tempo de duração. Tinham todo o aspecto de serem herdadas de um qualquer contentor do lixo, pois os dedos saíam um pedaço de fora dos buracos.

O seu olhar prendeu-se nos carros que paravam na frente de um edifício onde se encontrava um telão enorme com uns dizeres e umas figuras. As pessoas que saíam dos carros tinham um ar pomposo, bem vestidas, uns com roupas a rigor, outros com aspecto negligé como soi dizer-se. Dirigiam-se apressados para a entrada que os engolia a todo o momento.

A necessidade de obter algo daquela gente fê-lo aproximar-se com rapidez do local. Era uma galeria de arte, e numa das janelas laterais à porta, com dimensão idêntica, na parte de dentro via-se uma pintura em grandes dimensões. Era uma natureza morta, de um pintor muito conhecido. O Homem parou de olhar fixo observando em pormenor. O peru de papo para ar tostado, parecia deixar no ar o seu cheiro apetecível, um copo e uma garrafa, semi-cheios de vinho, frutos e sobremesas várias, enquanto olhava as mãos mexiam irrequietas, a boca abria e fechava como se mastigasse cada bocado, do que se deparava perante os seus olhos. Quanto mais olhava mais descontraído ficava, as suas mãos acariciavam a barriga. O mundo à sua volta desaparecera, nada havia ali a não ser o recheio do quadro e ele. De repente solta-se-lhe um arroto, que o deixa perplexo desviando os olhos para o lado com receio de que alguém tivesse ouvido. Quando o faz, vê passar junto de si uma garota morena, linda como o sol, esbelta, de blusa ligeiramente aberta onde se vislumbrava um peito firme e bem desenhado, na parte de baixo uma mini-saia, mostrando umas pernas altas elegantes rematadas e uns pés metidos em sapatos altos, abertos, deixavam ver uns dedos pintados de vermelho. Aquela imagem impactou-o fortemente e começou a sentir um aperto no coração, ao mesmo tempo que se sentia o corpo esvair-se, como se procurasse o chão... caiu.

Notícia: 12 de Setembro de 2012
Ontem pelas dezanove horas, junto à galeria Art Nouveau, na Rua José Pintor, um individuo do sexo masculino, com cerca de cinquenta anos, caiu inanimado. Prontamente foi socorrido e enviado ao hospital vindo a falecer. Conforme informação, dada pelo médico, nas urgências, o indivíduo com cerca de cinquenta anos de idade, morreu, de acordo com os sintomas, de congestão, razão pelo qual será autopsiado hoje mesmo, segundo o clínico, estranhamente, não possuía qualquer conteúdo no estômago. O indivíduo em causa, não possuía qualquer identificação, pelo que se pede a quem o reconhecer pela fotografia, que se dirija aos serviços de atendimento da polícia.



quarta-feira, 12 de setembro de 2012

AMOR SENIOR

Chegaram, sentaram-se na esplanada, deixando que a brisa os refrescasse, ele era alto enxuto, com o cabelo todo branco, calças cinzentas de tecido fino, camisa branca, sapato preto clássico, apontando para uns 65 anos, ela baixa gordinha, não demasiado, talvez com menos idade, ligeiramente mais baixa que o seu parceiro, com um ar simpático, sorriso nos lábios, vestida com uma blusa simples, preta, e um colete leve por cima, saia de tecido florido daqueles que parecem sempre encorrilhados, sapato preto de meio tacão.

Ele tinha uma voz seca, com tonalidade autoritária, marcial, ela com uma voz e uma forma de estar muito daquelas mulheres que está habituada a trabalhar enfrentando a vida, Ambos pareciam gente boa em plena reforma, ou com a vida já bem assente.

Interessante a conversa que se desenrolou, percebia-se estarem ali depois de um almoço de domingo, a dois, gozando um espaço das suas vidas, talvez viúvos querendo reconquistar a vida. Ele falava de um qualquer baile do “arrasta o pé”, local que se subentendia ser comum aos dois, no qual uns amigos lhe disseram terem visto alguém conhecido, ela pronta sugerindo ir ao local passar um bocado. Autoritário, macho, disse logo que não, de forma seca, justifica de seguida, começando a falar de visitar a filha "hoje" que reclamava a sua presença, segundo ele, a filha lhe estava a cobrar quanto à forma como vivia a sua vida. Ele lamentando ter de reclamar quanto ao seu direito de fazer o que queria da sua vida e não admitindo interferissem. A senhora, a seu lado, corroborava falando da sua filha e dos problemas comuns aos dois.

Tudo isto em voz semi- audível, percebia-se pelo decorrer da conversa que viviam cada um no seu espaço e que viviam a aventura de um namoro sénior, maduro. Vozes sem agressividade, palavras soltas um à vontade saudável de quem gosta de se encontrar, para almoçar, viver os momentos, falando gozando as delícias do amor, e depois retomarem as suas vidas no dia seguinte até ao próximo encontro.

Namoro moderno em “gente antiga”. Cada um com o seu próprio espaço, cada um com a sua família, cada um evitando confusões de uma decisão precipitada de vida a dois, com as famílias se misturando, com as confrangedoras situações que se conhecem entre casais divorciados, ou viúvos, com partilhas e direitos discutidos ao milímetro. Vivem a “anormalidade” de não estarem juntos como mandam as regras sociais, preferem a sua independência, económica e social, o seu espaço, a manutenção das suas vivências com os amigos, a não obrigatoriedade, de, por gostarem terem de se colar na pele do outro. Certamente terão cada vez mais ânsia de se verem, cada reencontro será mais rico que o anterior, haverá mais estórias para contar, mais partilhas a fazer, mais beijos e carícias para dar, mais prazer de estarem juntos. Naqueles momentos a dois, estão disponíveis em pleno um para o outro.

Não pareciam, os dois, pessoas dotadas de grande formação e cultura. Não sei como deduzi tanto sobre eles, e o que levou a pensar onde aprenderam tal forma de estar, mas julgo que na verdade a sabedoria e a experiência de uma vida a sós, após um divórcio, ou viuvez, por vezes dá tanta riqueza e liberdade, que as pessoas dela não abdicam de modo fácil ou menos ponderado.

Viver juntos uma relação de amor, já não é única opção. Importante é a alegria de se amarem quando juntos.

reENCONTRO E outras ESTÓRIAS



Procura no reencontro descobrir outras estórias e outros mundos então desconhecidos.

Variam as temperaturas nestes dias de Setembro, como variam os momentos dos afectos, uns mais quentes, outros calmos e saboreados como uma fatia de bolo tão apetecida.

As horas decorrem, passando o tempo de forma variada e criativa, só se sente que correm quando o dia acabou, quando se apercebem que mais um dia se foi e muito há para dizer e fazer.
Vivem-se intensamente todas as horas, desde o nascer do dia ao pôr do sol. Passeia-se junto ao mar, nos jardins, em Feiras Medievais, em ruas antigas que marcam a cidade dos esplendores de outrora. Enquanto isso, as máquinas digitais vão fixando em imagens, pedaços do dia e dos locais até onde a vontade e o tempo lhes vai permitindo chegar. ver e apreender nas nossas memórias. São variados os registos todos eles isolam momentos.

Saboreia-se a intimidade de um almoço, a calma do lanche ajantarado, ou de um jantar transformado em lanche. A comida e a bebida, embora agradáveis, são elementos de composição para que na mesa permaneçam entre gestos de ternura e conversas leves com laivos de sedução. São o prelúdio dos beijos no escuro, das mãos que agitam carícias despertando os corpos, para o amor sôfrego que tudo esquece.

Brevemente, estará de partida, cada um retomando os seus outros dias, onde a vida se desenrola na monotonia da sobrevivência, esperando ansiosamente outro reencontro, com novos momentos, com novos cheiros, carícias instantes e palavras soltas em noites cálidas. 


sexta-feira, 7 de setembro de 2012

TEMOS DE ACORDAR


Acordei, sentei-me na beira da cama e pensei, coisa que não convém fazer nos tempos que correm, Pensar pode trazer problemas, dizer a verdade é incómodo, podemos ser penalizados.

Neste meu pensar, lembrei-me daquelas pessoas que publicamente se assumem dissertando sobre as contradições e injustiças que neste país o governo aplica aos seus cidadãos. Pessoas que o fizeram num programa de grande audiência televisiva e foram punidos pelas entidades patronais, sem que a sirigaita que dirige o programa faça qualquer menção ao acontecido, mesmo quando do seu conhecimento.

Um pensamento leva a outro, fico-me de olho parado observando o soalho coçado da vida, que nestes meus sessenta e muitos anos, fui calcorreando para viver, ou sobreviver.

Desde que nasci até aos dias de hoje só ouço falar de trabalho, trabalhar mais, trabalhar com qualidade, trabalhar a renda da casa, trabalhar para comprar roupa, comida, pagar os estudos, ir ao barbeiro, ao médico. Trabalhar para ser alguém na vida, trabalhar se quero ter sucesso, trabalhar para ter boas notas, trabalhar pela dignidade, trabalhar, trabalhar, trabalhar.

Esta palavra trabalhar está encascada na cabeça, faz parte do quotidiano, está colada à pele, faz parte da sua coloração, então para que temos de a ouvir a palavra trabalhar todos os dias e a toda a hora pela voz dos governantes e dos patrões. Ouvimos dessa gentinha, que temos de trabalhar para salvar o país da crise, para salvar da crise as empresas, que temos de trabalhar aos domingos e feriados, sem compensação remuneratória, roubando-nos o descanso. Alteram-se as leis laborais para se aumentarem as horas de trabalho, os dias de trabalho e desclassificam-se as profissões para que aceitemos qualquer trabalho. Tiram-nos alguns feriados para trabalharmos ainda mais, tudo para salvar a crise criada pelo poder económico, em especial a banca, pelas más administrações sejam ela públicas ou privadas. E como se não bastasse, quando nos queixamos aos nossos amigos que a reforma não chega, eles dizem “arranja um biscate e vai trabalhando”.

Comecei a trabalhar com onze anos e fui percorrendo todas as escalas. Como aprendiz, como profissional, como responsável de serviço. Trabalhei e estudei ao mesmo tempo, até chegar ao ensino superior. Trabalhei para ajudar os meus pais, trabalhei em mais de um emprego, para sustentar a minha própria casa e filha, trabalhei para comprar um carro, trabalhei para pagar uma casa ao banco, trabalhei para comprar os meus livros, ou seja, tudo o que tenho ou conquistei na vida, foi à custa de trabalho, trabalho e mais trabalho. E agora quando devia pensar em descanso falam-me novamente na necessidade de trabalhar, com a agravante de não haver nem local nem trabalho para o fazer.

Trabalhei descontando para o fundo desemprego e segurança social. A reforma é o resultado de descontos durante anos, portanto é o meu dinheiro e não um imposto, por isso não devia ser manuseado pelos governos a seu belo prazer. A maioria dos que trabalharam, recebem uma côdea pequena, não só porque descontaram pouco, do pouco ganhavam, mas mais porque a administração do seu dinheiro foi sempre do modo que o estado entendeu. Não somos nem nunca fomos funcionários públicos somos reformados, com o nosso dinheiro.
Os que mandavam trabalhar receberam sempre muito e têm uma reforma adequada aos seus pergaminhos, porque sempre ganharam muito dinheiro mandando trabalhar os outros, e até fazem contratos onde está estipulado quais os valores de reforma, ou de despedimento, independentemente dos anos de serviço, ou das razões pelo que são aplicadas.

No decorrer de todos estes anos, também me fui apercebendo, que nem todos temos de trabalhar para conseguir o que queremos, há muitos outros que desde que nascem tem berço de ouro, ou sempre foram protegidos e nunca souberam o que é querer comer e não ter. Esses são normalmente os que não trabalham, nem nunca souberam o que isso era, mas sabem mandar trabalhar, com voz suave de língua enrolada e com a curva da felicidade a marcar a sua imponência. Há outros que aprenderam desde cedo a técnica do “venha a nós o vosso reino” e fazem todo o tipo de trafulhices, vivem que nem nababos, sem terem muito trabalho e que sempre se safam.

Continua o olhar parado, e a mente em alta rotação. Penso porque não mandar tudo à merda e pensar na forma fácil de me governar. Porque razão em vez de trabalhar não aprendo o verbo roubar? Sim, se a reforma não chega e se trabalhar foi o que fiz toda a vida, e nada tenho, para quê continuar a fazer algo que não me rende nada e me vai manter em dificuldades?

Sim isso, roubar é menos trabalhoso e mais rentável. Não o roubo dos comuns ladrões que dá muito “trabalho”, mas aqueles roubos que alguns fazem, que se apelidam de desvios, e que quando descobertos, dão prisão domiciliária ou cela de luxo nas cadeia públicas, ou correm pelos tribunais tempos infinitos até prescreverem.

Na verdade se o dinheiro que eu “depositei” durante anos, no fundo de desemprego e na segurança social, é-me retirado pelo governo, sem minha autorização, fazendo dele o que bem entende não respeitando os meus direitos afinal o que está a fazer é ensinar-me a ser desonesto. Se me retiram o meu dinheiro e me taxam com impostos para pagar compromissos e debelar uma crise, pela qual nós povo não somos responsáveis, como acontece actualmente, mas sim a alta finança da qual a banca é o seu expoente visível, afinal o que me estão a sugerir? Que seja desonesto, não cumpra os compromissos que assumi perante outros, porque o estado me delapidou os fundos, ou em caso extremo que roube para comer, ou para cumprir com os meus deveres.

Andei anos escavando a vida para obter um situação económica e social digna, sempre trabalhando e ouvindo a palavra trabalho, e agora a caminho do fim da vida, dizem-me para me desfazer de tudo o que consegui, entregando a casa ao banco que está quase paga e me custou duas vezes e meia mais, que venda o carro que já velho nada rende, que me desfaça de tudo o que duramente obtive pelo meu trabalho, sério e honesto, e quando por fim o dinheiro se esgotar trabalhe ou roube para sobreviver.

A raiva, surgida pela impotência de nada poder fazer para travar tal violência tira-me do caminho correcto, provoca-me insónias e prepara-me para perder qualquer sentido de responsabilidade.

Será que o novo sistema de neo-liberalismo comandado pela economia de mercado(?) quer fazer de todos nós bandalhos exploradores, egoístas e ladrões de colarinho branco? Será que temos de aceitar que uma qualquer Troika venha aqui aplicar mais medidas de austeridade que visam sempre a maioria do povo e deixam que as minorias privilegiadas continuem no seu cantinho enriquecendo com a crise?

É tempo de dizer basta. É tempo de ganhar a rua e parar com esta austeridade déspota sobre o povo.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Feiras de PROdutos BIOlógicos


Quando de visita a Vila do Conde neste mês de Agosto, ao deambular pela cidade, a certa altura, num grande jardim (Júlio da Graça, julgo), deparamos, com uma feira de produtos agrícolas dos tais chamados biológicos. Hoje em dia, é vulgar em várias cidades do país, se encontrarem locais, em dias fixos da semana, onde estas Feiras de Produtos de Agricultura Biológica têm lugar com a exibição e venda directa de produtos biológicos, da época, que vão desde ervas aromáticas, produtos hortícolas, frutas, legumes, frutos secos, compotas, ovos, mel, etc., até aos enchidos. Estas feiras permitem um maior contacto do produtor com o consumidor, beneficiando ambos, e são um incentivo ao desenvolvimento destes mercados e ao aparecimento de mais agricultores, que com escassos meios conseguem produtos biologicamente mais saudáveis e apetecíveis.

Voltando à Feira

Enquanto caminhávamos fomos conversando, apreciando as várias bancas e seus produtos, elogiando as qualidades e vantagens daquele tipo de feiras. A certa altura, vimos um dos feirantes vendendo melão Casca de Carvalho, melão este, conhecido pela sua qualidade picante, cheiro e paladar inconfundível, e que é considerado uma raridade, pois só se encontra à venda em alguns locais. Motivados, perguntamos o preço, íamos sofrendo um colapso, mas resolvemos comprar um para nos deliciarmos, mais tarde ao jantar, pensando para nós próprios que as coisas boas não tem preço. O sr. que nos atendeu, garantiu-nos que estava pronto para comer, depois de ir um pouco ao frigorifico para refrescar, ficamos felizes, pensando no pitéu que nos estava reservado. Na verdade o seu cheiro impregnou o carro, durante o resto da viagem.

Parte-se do princípio, talvez erradamente, que os produtos comercializados naqueles locais primam, não pelo tamanho, ou outros factores estranhos e artificiais, mas pela qualidade e sabor. Na verdade, podem efectivamente estar libertos de pesticidas e de adubos artificiais, mas no que refere à qualidade... a realidade prova que nem sempre é assim, e daí sofrermos uma decepção. O melão estava maduro, mas não tinha qualquer paladar nem sequer era doce.
Todos sabemos que as pessoas não estão dentro dos produtos, mas pelo menos têm de ter comportamentos, como por exemplo, experimentar “calando” o melão, provando os seus próprios produtos, ou pelo menos terem provas pelo hábito e informação de outros consumidores, de que a qualidade se garante.

Como já não é a primeira vez, que me acontece comprar produtos biológicos e a qualidade ser fraca, começo a pensar, que por vezes alguns produtores porque a produção dá muito trabalho -aos que dá - acham que por ser biológico o preço tem de ser caro e a qualidade é o que se puder.

O que me ficou na cabeça de imediato, foi que afinal tinha comprado um melão, uns dias antes, no supermercado, por uma pechincha e ele tinha muita qualidade, para quê então comprar biológico???

Se a qualidade e o sabor não vingarem, acabarão por matar este novo nicho de produtores e de mercado, que já tem algum progresso, pois não só do “biologicamente correcto” vive o homem.


NOTA: Quero desde já esclarecer que sou um defensor acérrimo deste tipo de produtos e apoio todas as feiras e acções desenvolvidas neste sentido. O que eu pretendo aqui é lembrar da necessidade de haver cada vez maior rigor e qualidade na oferta, para que as pessoas possam confiar cada vez mais no produto que naqueles locais são comercializados.