domingo, 11 de outubro de 2015

CARTAS SONHADAS




Tenho escrito muitas cartas sonhadas para ti, Cartas nunca acabadas, ou enviadas, Cartas que escrevo quase todas noites, Por vezes a tinta escasseia da imaginação e tenho de as repetir desde o começo, quase sei de cor grande parte delas. O começo, sempre igual, bom dia, Minha Flor..não era o teu nome, mas nas cartas sonhadas era sempre assim que eu te identificava. Muitas vezes recusava-me, de propósito, a acordar agarrando-me ao prazer que delas tirava e o que projectavam de momentos e vivências.
Esta noite, a carta que escrevi levava um sobreaviso, quanto ao definitivo... protelei o mais possível esperando que alguém me acordasse antes de enviar, não queria que partisse... a minha mente não encontrava endereço. Era como se estivesse em coma induzido para encontrar tempo para debelar a doença e atenuar a dor. Ela falava de tudo o que existira de nós, o que éramos de loucura e paixão, de projectos, e que agora só nos sonhos acontecia, pois há muito partiras. Temia de mim, se ela partisse, perderia o sonho e tua companhia, que em alguns casos quase real.
Quando me acordaram repentinamente, eu que ansiava por isso, naquele momento me senti infeliz pois não queria ter sido interrompido, Acordara contigo tão real em mim, que sentia ainda o calor e sabor dos teus lábios sobre os meus e o cheiro do teu corpo espalhado pelo quarto. Era este momento que me dava algum sentido e às cartas sonhadas, continuavas alimento das minhas fantasias, afinal o que temia perder. 
dc

sábado, 10 de outubro de 2015

SAUDADE...





hoje
desconsolei
por não ser poeta
desencontrei
a palavra certa
para o tamanho
da saudade

nos dicionários
consultados
os pensamentos
estavam alinhados
todos perdulários
quanto à saudade

sem tradução
em outras línguas
fiquei sem saber
como pode o coração
estrangeirar
de saudade.

dc




quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Sou folha caída




Sou folha caída
Duma árvore com vida.

Sou a queda necessária
Histórica e revolucionária
Dialética e sua espiral
Cumprindo um ritual

Na terra enriquecida
À árvore dou vida

dc

terça-feira, 6 de outubro de 2015

O Ser, da gente






Pousam
No teu contorno
As folhas caídas
De Outono

Escolheram
Teu corpo
Tua frescura
Tua forma
Tua candura

No acaso
Do seu cair
Acentuaram
Tua beleza
Com a cor
Da natureza

Folhas caídas
Na terra
Em seu tempo
Numa troca
De’vidas
Como húmus
Do renascer

Assim
Como na pele
Assim
Como no corpo
E seu ventre
Cai a semente
Nasce humano
O Ser da gente

dc

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Lá, na imaginação



No segredo, do nosso encontro de palavras, se descobre a beleza das rosas, sem a dimensão do seu cheiro nem o sentir dos espinhos que as protegem. Nelas a noção de como agarro teu sorriso e fico com ele, passeando nos meus pensamentos, dando cor aos dias, limando as arestas de momentos difíceis, aceitando que traga aos meus olhos brilhos de alegria. 
Faço-te princesa do meu reino, mesmo não sendo príncipe, servo, ou rei, és personagem principal do meu conto, ilustrando meu coração. Imagino-te, na espera do meu regresso, vindo da floresta distante, destruídos os obstáculos e eliminados os inimigos, trazendo a paz ao teu regaço e esperança renascida. 
Sei-te sabedora de corações doridos, de sentimentos feridos, de vontades e desejos capazes de grandes batalhas, Certamente a distância existe como um factor de distracção, somente isso, do toque da realidade física, mas prova que os sentidos e emoções são fonte de proximidade.  
Na verdade, rosas, sorrisos e brilhos, são acessórios neste nosso conto de fadas, mas que nos fazem tão bem, que até a distância, a espera e a realidade física, se esbatem, com o calor das palavras e seus sentidos, tornando-nos a realidade possível...

dc.
 
 
 


sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Como folhas caídas



O verde acastanhado das folhas, a terra coberta por diferentes matizes, húmida das primeiras chuvas, o fumo saindo das chaminés das casas, como se fossem comboios parados na estação esperando ordem de partida, O balir dos animais, pastando, A brisa tirando as folhas que ainda subsistem em alguns galhos, vão-no carregando de nostalgia e uma melancolia enorme se apossa de si. 
O olhar se perde na planície a desaparecer da vista, num observar de dentro, em que se confundem, realidade e sentir, olhar cego que não vê, vive da memória do que reconhece, agarrando tudo o que se liga ao que decorre no seu pensamento. Como folhas caídas, despindo as árvores, criando o húmus da terra, também vai rasgando, páginas sucessivas, dos registos que se foram construindo, entre dores e alegrias, deixando correr o filme até ao The End, que o permita regressar à realidade e plantar em terra fresca novas ideias, esperança e força para novas batalhas. 
Saber quanto tempo decorreu, entre a chegada e a partida, é secundário, importante foi o que aprendeu e amadureceu nesse estar... frente aquela imensidão, integrado, como elemento indiferenciado e constituinte da natureza, lhe permitiu se redescobrir dentro da sua própria natureza.

dc



quinta-feira, 1 de outubro de 2015

CHUVA DE OUTONO




Cai vertiginosa deslizando, nesses montes e vales, regando a terra fértil, refrescando seu ardor. Ela se deixa possuir por aquele, algo, sem contorno, que revela sua forma e liberta seu espírito para voos inesperados. Corre, escorre e percorre, massajando, leve, docemente, num êxtase inexplicável, como se num deserto, encontrasse a fonte da vida.
Ali, completamente só, despida de tudo, submete-se à sua limpidez, lavando sujidade ou pecados maiores, por vezes resíduos de um amor não desejado.

dc