Entrei no jardim para fazer parte da minha caminhada, Quatro voltas da praxe e saía. Como sempre passava por aquele banco, estava integrado no percurso estabelecido. Na primeira vez que passei, ia tão concentrado no exercício, que não me apercebi que estava ali gente sentada. Ao passar, à segunda volta, reparei num casal já na casa dos quarenta, com ar de gente simples, que estava sentado se namorando. Foi um olhar de relance, sem espanto, A tarde estava propícia ao namoro, O sol entreolhava pelo meios das árvores iluminando o caminho com uma luz fantástica e embora eles estivessem na sombra formavam um quadro que funcionava em contraponto com toda aquela vegetação e cor. Digo namorando pelo modo como se envolviam, ele com um ar meio tímido quase com receio de a abraçar e ela falando e segurando no rosto com uma das mãos procurando a sua boca para o beijar e se chegando mais perto dele. Na volta seguinte, ela quase sentada no colo dele e de rosto encostado, meio se escondia de quem passava, mas não me parecia de vergonha e sim de ternura. Agora, olhei mais atentamente, observando pormenores, que me teriam levado a deduzir, serem gente simples do interior, A roupa que vestiam, a linguagem usada na conversa, o rosto dela sem maquilhagem... Ela mais envolvida, ele parecia ter medo que ela avançasse mais. Na quarta volta ela beijava-o sofregamente e tentando segurar-lhe o rosto com as duas mãos, num gesto amoroso, tudo emoção.
Este interlúdio na caminhada transportava-me para pensamentos diferentes dos habituais e para raciocínios vários para o que me era dado observar, conjecturando uma autêntica estória de amor, daquelas rocambolescas. Que faziam dois quarentões namorando ali no jardim? Não que estivesse errado, mas era pouco normal, seriam casados, amantes...eu ouvia-os falar, no entanto percebia mal as palavras. A emoção e a curiosidade aumentavam, e mais uma volta e lá estava eu em cima do acontecimento, e desta vez ele estava com o telemóvel na mão e ligeiramente afastado, como se estivesse a ver algum número ou mensagem. Eu continuei coscuvilhando, de mim para mim, debulhando tudo, para tentar encontrar respostas à minha curiosidade. Quando já estava de saída aconteceu o inesperado, que me deixou confuso e se arrastou, na minha mente, até quase chegar a casa, Foi vê-la a chorar e dizendo “ se calhar a culpa é minha por gostar tanto de ti”, ele compungido parecia encolher-se.
Fui pensando, na frase, e no seu significado. Será que ela gostava, ou estava convencida de que gostava? Porque razão se pode ser culpado de gostar de alguém? Pela indiferença do outro, sua ambiguidade, ser casado, ter medo de mostrar os sentimentos? Qual a verdade, ou mentira, que magoara? Como se mede o gostar? O que é gostar, ou amar? Sem querer estabelecia pararelos com outras estórias, sempre pensando na efemeridade dos momentos que nos acolhem. Começa-se sorrindo, abraçando, amando, fazem-se juras, promessas, e de repente tudo se altera, o momento de encanto se perde e já nada é como dantes. Na maioria das vezes, não muda para melhor, é sim o prelúdio de um afastamento maior, com recados à memória que se tornam inesquecíveis.
dc
quarta-feira, 8 de abril de 2015
"a culpa é minha por gostar de ti"
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Foto. Diamantino Carvalho
domingo, 5 de abril de 2015
UMA AULA DIFERENTE
Chegou, olhar triste dominando o rosto, cabelo preto curto, meio despenteado. Corpo franzino, de baixa altura e sobre ele um top de malha e umas calças jeans azuis.
Nos espaço envolvente onde entrou, vários homens e mulheres tinham nos cavaletes, ou no regaço, pranchetas com folhas de papel almaço de formato A2, ao seu lado vários riscadores, tintas e pincéis. Preparavam-se para uma aula de desenho de modelo, enquanto iam falando entre si, não se aperceberem da sua chegada. Nas primeiras aulas de modelo, nú, havia uma espécie de constrangimento, as conversas eram mais nervosas. Só ao fim de alguns minutos de poses rápidas e curtas se iam libertando.
Lentamente, se despiu exibindo o corpo magro quase esquelético, sem formas exuberantes, mas suficientemente modelado para o que seria desejável, subiu para uma espécie de palanque e colocou-se em pose. Todas as poses que ia assumindo, de acordo com a vontade do professor, pareciam difíceis, o rosto fazia um esgar quase irónico, ficando depois como uma natureza morta não emanava nada que motivasse quem desenhava. Todos captando a estrutura morfológica, no entanto não conseguiam dar-lhe qualquer vivacidade. A única vantagem que tinham, em relação os modelos de gesso, era que aquele se mexia assumindo posições diferentes rapidamente, o que obrigava a uma capacidade diferente de observar, no resto toda ela era gesso, mas maleável, não lhe chamaria de plasticina, porque a sua pele era muito branca quase morta. Nela toda, havia uma parte que era real, os seus olhos, talvez por aquele não sei quê de tristeza, que assumiam por vezes ironia ou indiferença com que se fazia presente. Emanava a agonia das pessoas que executam algo para o qual não estão destinadas. Era como se quisesse comunicar-nos, que fora a necessidade económica a quebrar-lhe o orgulho e a trouxera até ali, para não precisar de se prostituir fisicamente... o resto seus olhos explicavam
No final da aula, olhei os esboços, neles só via riscos, vivos expressivos, mas o modelo propriamente dito não estava lá, tinha-se diluído nas linhas e nas cores usadas. Não ousara reproduzir aquilo que efectivamente vira. Afinal a aula de modelo nú, não fora tão atractiva como alguns pensavam, tinha mais de humano, mais de amor, mais de sentir, que simplesmente aprender os movimentos do corpo e o seu registo no papel.
dc
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quarta-feira, 1 de abril de 2015
encontrei a minha "CARA METADE"
Não, não é engano por ser dia um de Abril. Encontrei finalmente a minha cara metade, andei anos a fio procurando mas valeu a pena, Percorri hospitais, distribui papéis com a imagem, participei à policia, contactei por e-mail amigos vários, e até salafrários, na esperança que fosse encontrada. Sofri penas como nenhum, nessas ruas do silêncio que é a perda de alguém, que amamos. Todos os dias quando pelas ruas caminhava, olhava as gentes, nos olhos, na esperança de que eles se traíssem e me dissessem onde ela parava.
O que fazem duas metades perdidas vivendo de forma incerta?
Não ter a cara metade, é ter a vida a meio, sem equilíbrio, é como se uma parte de nós não existisse, estivesse já morta,
Digo mais, valeu a pena, quando hoje ao acordar, de repente, senti que a tinha encontrado, fiquei feliz como um passarinho, que se liberta da gaiola. Primeiro hesitante com a novidade, com as asas meio presas, e depois voando com todas as certezas.
Ainda estou sentado, de olhar parado, a congeminar como foi possível, perder este tempo todo, sem a oportunidade de voltar a ser o que era, encontrar-me com a vida como se fosse a Primavera.
É de todo impagável, tem um nome delicioso que dá gosto pronunciar, e na arte muito para dar que falar, Simetria, de seu nome, tem a alma que eu gosto de sentir ao olhar a natureza, e nesta todos os dias a encontrar.
dc
terça-feira, 31 de março de 2015
antes QUE A MORTE NOS SEPARE
Fui escrevendo as palavras umas atrás das outras, sem pensar, não importava o que significavam, deixava-as correr sem me preocupar com o sentido, esperava com isso que algo se revelasse, de dentro, que eu desconhecia, como se fizesse psicólogo de mim próprio. O resultado foi surpreendente, mas não vou revelar. De uma coisa fiquei com a certeza, muitos de nós, ao lermos determinadas palavras, vamos logo, de forma directa, ao seu primeiro significado, e depois... depois vêm uma série de outros que têm que ver com a aplicação junto de outras palavras, da entoação que lhes damos, e os muitos sinónimos que elas vêm agarrados. No entanto, o que de facto me fez pensar, foi a repetição de algumas que fui escrevendo... amizade, prioridades..objectivos, amor, ternura, abraços...sentimento, saudade, morte, presente... tempo.
Tempo que foge aceleradamente, exige objectivos, prioridades, o gozar de o amor e sentimentos que com ele vêm colados, antes que a “morte nos separe” e o presente fique enfadonho.
dc
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foto: Hengki-Koentjoro
segunda-feira, 30 de março de 2015
TE SONHO PERDIDA
Te sonho perdida neste meu pensar,
Nesta alma ferida de muito te amar.
No chão da terra prostrada, deixo-me ir
Nos sonhos esquecendo teu partir.
Não sou santa, nem de nome, Maria
Nem ingénua, talvez, quanto queria
É só meu coração, com sua nostalgia
a te ver regressar num novo dia.
dc
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Foto: web
sexta-feira, 27 de março de 2015
Na noite adormecida....
.... insinua-se o silêncio, repousam os sonhos e acordam-se fantasmas.
Entro na cama, em pezinhos de lã, procurando teu aconchego, o conforto do teu calor, a sedução da tua pele, e o prazer de te abraçar eternamente, como se desaparecessem os limites do mundo e ficássemos em céu aberto, olhando as estrelas. Inconsciente, não te dás conta, e deixas-te imobilizar em meus braços encostando tuas costas ao meu peito. Sinto o cheiro do teu corpo, o cabelo sedoso, o teu respirar leve, a fragilidade aparente de toda tu, ali, minha. Sem posse, é amor límpido.
Tenho medo de te perder, quando a noite te leva mais cedo arrastada pelo cansaço. Eu fico sentado, na sala vazia, sem ti, A angústia me aperta. É aí que os fantasmas se apoderam de mim, A mente julgando todos os gestos menos pensados, as palavras que não foram ditas, o apoio que nunca me falta, o teu sentimento que engloba todo o amor que possuis dentro de ti e me transmites.
Talvez esse teu adormecer antecipado, tenha toda a razão de acontecer, é ele que me alerta para te amar, como adoro fazer, e me faz entrar devagar, devagarinho no nosso leito, te abraçando de mansinho, afastando as dúvidas trazidas no peito.
dc
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Imagem: Diamantino Carvalho
terça-feira, 24 de março de 2015
EU fiz a minha Primavera...
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Foto:Diamantino Carvalho
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