segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Segredo entre lábios



Quando os lábios se misturam, nesse beijar de bocas inquietas, de línguas conversando, de sabores se cruzando, tudo em nós se altera, deixando-nos a mente vazia, o sangue afluindo à superfície da pele, e o coração se acelerando em desejos e emoções que as palavras escasseiam no descrever.
Como se explica a maciez dos lábios, uns se encontrando nos outros, o calor que emanam, a mordida leve, a sofreguidão e ansiedade na procura, querendo, cada boca, saber da conversa invisível que ali acontece. Comportam-se como invisuais, tacteando na descoberta, querendo memorizar a existências dos contornos e prender os sabores no temido findar. Não existe ampulheta, mecanismo que estabeleça o tempo, nem quando finda. Sabe-se, por vezes, as bocas são atrevidas, se afastam percorrendo caminhos mais alargados, indo mais fundo, surpreendendo-nos nessas outras experiências, no entanto regressam sempre ao princípio, nesse selar de amor e paixões que ficam no segredo entre lábios.

dc

domingo, 27 de setembro de 2015

No Banco do Jardim



Quero sentar-me naquele banco de jardim, meu braço sobre teus ombros falando dos nossos sonhos e projectos, Sentir a brisa agitando as árvores, o chilrear intenso dos pássaros no seu recolher do fim de tarde, e ver o sol avermelhado se escondendo na linha do horizonte.
Quero ficar naquele sem tempo, Sentindo o calor dos nossos corpos, que se aconchegam, no arrefecer do fim de tarde, vendo a noite entrando pela cidade, recebida pelas as luzes dos candeeiros.
Esperar que os ruídos dos carros vá desaparecendo, e as nossas vozes se tornem tão nítidas como os nossos desejos. Gozar o prazer de sentir os meus dedos brincando no teu cabelo, vendo-te fechar os olhos no embalo, procurando colar as costas no meu peito, enquanto vou moldando as palavras, junto do teu rosto. Até que aconteça o beijo, selo de vontades, assinatura de gostar, testemunhado pela natureza que nos envolve. Depois...depois deixar que tudo vá evoluindo, no curso normal, registado no corpo e na pele, para lembrança futura.. e depois, esse outro depois mais longo e saboroso, de sorriso na boca, olhos brilhantes, no regresso ao calor da casa e ao descanso, num caminhar pela noite, que já foi tomada pelo luar e os gatos.
dc 

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Todas as vezes..





Todas as vezes
Tantas vezes

Na partida
Ou na chegada
Na janela fechada
A mão se abria
Como sinal de alegria
Ou de um adeus
Que se repetia.

Só no fim da espera
Dum comboio que partia
Ou dum outro que chegava
O beijo acontecia
E a saudade começava.

dc

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Mais além



As mãos apoderaram-se do meu rosto, enquanto seus lábios cálidos, maduros, pousavam nos meus, Sentia o calor do seu amor, o perfume de seu corpo, e os arrepios como poema escrito na sensibilidade da pele.

Os corpos se colam, o espaço entre eles é o desenho da forma, é a linha que limita o risco que no papel dá o contorno aos corpos, como a sombra a existência do ponto de luz, o volume organiza o espaço.

Somos nós no prazer, do reencontro, sem fugas, retidos no mesmo espaço onde nos apetece divagar, descobrindo o mais além, tão infinito, tão generoso, que nos permite a exaustão sucessiva, e a retoma ao ponto de partida, como ondas que se repetem na existência do mar. Todo o ar está cheio de nós, o que nos rodeia assume o brilho dos nossos olhos, Nós somos aquilo que sempre fomos, e, se alguns dias nos afastam no calendário, será no prazer de um tempo, que queremos nosso, que se fará a eternidade do que nos une.


dc

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

DE costas voltadas



Perdemo-nos nas minudências, nos jogos do poder, esquecemo-nos do que entendíamos ser, dois são mais do que a sua soma. Valorizamos o que não presta, e não aceitamos o que é da natureza da vida . Agarramo-nos cobardemente à superfície, das coisas para não entrarmos mais fundo nas emoções e na razão que nos levam à partilha, de sermos capazes de aceitar o outro invadindo o nosso próprio espaço temporal. Somos solidários, nas ruas e abrimos as portas aos outros, mas fechamo-nos a nós. Temos medo de correr ao lado pelo simples prazer de desfrutar, queremos sempre chegar em primeiro. Há quem troque uma corrida na estrada de conversas recheadas de risos e emoções no seio das gentes, pela obsessão de chegar primeiro, para ganhar a medalha que morre na vitrina, que é importante para auto estima, mas perdem a realidade de sentirem vivos.
São coisas da vida, temos o pássaro na mão, confiante alegre e de repente, procuramos assenhoramo-nos da sua liberdade e da sua natureza, mesmo sabendo que não o devemos fazer, e surpreendemo-nos quando morre, porque apertamos de mais os dedos para que não fugisse.


dc
...A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.

A dor é inevitável. O sofrimento é opcional...
Martha Medeiros


sábado, 19 de setembro de 2015

Hoje. este sol


O sol entra pela janela enchendo a casa, é um sol claro brilhante, que atravessa a atmosfera, o céu límpido de Outono. O sol de Outono é mais único, quando as primeiras chuvas parecem aspirar todas as poeiras, como que se quisessem abrir as portas para ele passar e chega até nós, por vezes frio, no entanto rico na força que nos transmite, para superar o habitual sombrio inverno.

Hoje, este sol trouxe-me a saudade,

Este seria o “nosso” sol, idêntico ao que connosco se passeava, nas margens do rio, quando me visitavas, e do mesmo modo afastando tudo o que nos consumia, naqueles entretantos em que te ausentavas, Inicialmente tudo era um pouco frio, talvez pelas ausências que nos marcavam excessivamente, mas o reencontro fazia esquecer, de forma breve, tudo, e aproveitávamos o brilho de todos os elementos que nos faziam felizes, ultrapassando tudo e renovando para que não esmorecêssemos.

Hoje, este sol trouxe-me à realidade.

O “nosso” sol” trará sempre saudade, mas dificilmente o que sempre tivemos, Embora se diga que o sol nasce para todos, não nos ilumina todos os dias de igual modo, como o água do rio não passa duas vezes pela mesma margem.


dc

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

a CARTA



Gostava de ter coragem para te escrever, uma carta, daquelas que se escrevem em papel especial e que cheiram a enamoramento. Escrever com letras redondas, de traços incertos, espessuras diferentes, Cada palavra com o seu significado colado a expressão do seu desenho, às emoções nesse acto de realizar escrita. Gostava que assim fosse, marcada, legível, identificada com o sentir de quem escreve, deixando claro o ADN da origem. Mas perdi o jeito de escrever, de me revelar, selando o meu dizer com a expressão viva, quase arte, das letras da escrita. Aquele jeito de escrever com vocabulário escorreito, entre as intenções e os grafismos das letras trazendo coladas as emoções.

Uma carta, que quando olhasses a visses como tua e minha, Que quando a abrisses tivesse o meu cheiro, o meu gostar, Que quando a lesses, te sentisses como cumprindo um ritual delicado, envolvente, com pausas, saboreando cada palavra, cada frase, sempre de encontro ao encantamento do significado, da preocupação cuidada do desenho das letras, agitando teu peito de fervorosa alegria e emoção descontrolada da empolgante novidade, e concluindo, até que enfim, escreveu.

Sinto a necessidade e quero escrever, mas retraio-me num jogo de ping pong entre o querer e a inércia e o medo de não sermos definitivamente.


dc