Apaguei tudo aquilo que te documentava e que me
lembrava de ti: as fotografias, a escrita trocada, a morada, os números de
telefone, as ligações digitais, a forma de vestir, as reacções intempestivas,
as frases menos assertivas; até, coloquei um perfume activo dentro da casa para
apagar os cheiros que me lembravam momentos em que estávamos como unha e carne,
pele sobre pele, boca sobre boca. Recorri a todos os estratagemas, só não
contei que a memória me atraiçoasse, com outros processos, intervindo, recordando-me
a todo o momento que, tu existes, e estás algures vivendo. Quaisquer olhos que
vejo são os teus, se o cabelo tem determinada cor, ou formato, lembra-me o teu;
qualquer figura que circula, independentemente do lugar ou espaço, perto ou longe,
tem algo de teu. Até as imagens na publicidade, nos filmes, na internet, ou nas
revistas de entretenimento, sempre me trazem à memória algo da tua pessoa. Mas,
mais incrível de tudo, é ter-me deparado com este texto, escrito por ti, e
guardado no meio de centenas de folhas de papel para rascunhos:
Passear de mão dada..gargalhar de felicidade…ver estrelas aconchegada num
abraço…discutir no meio do hiper o que fazer para o jantar…cheirar velas de
baunilha e chocolate e pensar qual das duas comprar para aquela noite
mágica…ver um filme debaixo da manta e comer pipocas os dois…
Sentir
,,,saborear..absorver…partilhar e viver intensamente as emoções e os sentidos!…gostava de voltar a ter
isto tudo!…mas não tenho e possivelmente já não terei!
Se o Universo faz isso, será que o faz para não desistirmos, ou para que
aprendamos pela experiência? Seja qual for a intenção, demora tanto a acertar, nem
determina uma data para que se cumpram os seus desígnios, em vez disso, nos atrapalha
a vida e o tempo de a viver.
dc