terça-feira, 23 de junho de 2020

A espera é longa


A espera é longa a indecisão nela vem colada torna a razão desequilibrada e a espera acentuada.

Esperar significando tempo, faz a esperança de realizar perder-se do sentimento.


Não quero esperar nem dando tempo, nem esperar de esperançar, perde-se até o momento de recomeçar.

Esperei como sempre espero, já não sei, para ser sincero, se é porque quero, ou por não saber o que espero.

dc


domingo, 21 de junho de 2020

Domingo empanicado


Fechados, isolados, com o cutelo sobre o pescoço, vamos sendo intimidados com o medo da morte ao virar da esquina. Permanecemos, egoístas, defendendo o nosso castelo, mascarámo-nos, fugimos de quem gostamos, afastámo-nos de encontros em passeios, e das risadas em comum. Ouvimos as notícias, caindo como se fosse chuva, algumas delas contraditórias, e assim as pessoas não sabem a quantas andam. Vamos ficando calados, ou falando exageradamente do que desconhecemos e aceitamos por obediência, não por consciência. Ontem quarentena, mal conversada, hoje calamidade indeterminada. Empanicados, sujeitos à voz de quem manda e pouco esclarece, cortam-nos as pernas à esperança, ou nos dão como saída um futuro onde eles são donos e senhores, governando em nome da segurança, pela troca da liberdade. Há que abrir bem os olhos, dimensionando até onde os deixamos ir. Neste mundo “moderno”, somos telecomandados nas decisões, e aceitamos ser policias de possíveis servidões.

dc

quinta-feira, 18 de junho de 2020

Sou a sombra do que nunca fui.

A frase, saiu sem pensar, ganhou expressão por si só. O clima está incerto, faz sol, ou chove, há vento, ou uma ligeira brisa, o calor é imenso, no virar da esquina o frio segue. Tudo muda na incerteza dos minutos, dos gostos e desgostos, da mente perturbada, congelada, que não pensa, são os dedos por si sós que se movem, ganham vida própria. Serão comandados pelo subconsciente? Responderão directamente ao coração, ou não querem saber de nada disso? Confuso? Não sei, os dedos continuam carregando nas teclas, umas vezes depressa outras devagar, sempre marcando letras que fazem as palavras, os raciocínios e continuo sem pensar da razão do acontecer. Como aquele beijo que damos sem pensar, o abraço que damos sem explicar, o restar em vez de partir, a respiração que funciona mesmo sem pensar.
As palavras na sua suavidade, ou intensidade, por vezes surgem à frente, saem da boca e abstraem-se da pessoa que as solta, tantas vezes tem doçura e mel, outras tantas vinagre e sal, em ambas as situações são tempero de vivências, são reflexos de personalidade expressando de que massa somos feitos. Lá chegarão as alturas, em que será necessário, escolher as palavras com cuidado, com a precisão necessária, em razão do momento. Até lá deixarei que elas sejam livres e se façam sentir. Que as leia quem quiser, como quiser, e como eu, não pense demasiado na sua adequação. Sirvam-se delas gozem a sua sonoridade, fiquem-se pelo gozo da repetição ao serem pronunciadas, fiquem com as que gostam no vosso acerbo, e disparatem insultando quem acaba de se pronunciar, escrevendo tudo isto.

dc


domingo, 14 de junho de 2020

Basta ser domingo



Tudo se mantém entre o sonho e o pesadelo da realidade. Que importa quantos anos passem, quantas as caminhadas feitas sem destino, quantas as manhãs frias pela ausência, quantas noites escuras com breu de olhos abertos esperando sonos, quantos os silêncios com o olhar perdido nas paredes carregadas de livros e pinturas, quantas as flores cortadas ou árvores podadas? Nada. Tudo isso são coisas que não arredam o que sente dentro de si. Ficaram os cheiros, a pele tatuada pelo toque dos seus dedos e doçura dos seus beijos, o amor feito sem pressa, as idas e vindas quebrando tempo e distância trazendo o sorriso e brilho aos olhos; a paragem do tempo, sentados na beira rio junto à foz, olhando o morrer do dia na linha do mar. São memórias em tinta invisível que facilmente se revelam, desse mundo submerso entre o sonho e a realidade, como o facto de ser domingo.

A data não está marcada, os dois ainda não têm a sabedoria da natureza na rotina das estações do ano, ou do ciclo das marés. Um dia irá acontecer, mais cedo do que tarde, e nessa altura se saberá qual o fio condutor que mantém os espíritos ligados a essa chamada, estória de amor.


dc


quinta-feira, 4 de junho de 2020

Imagem insólita


O som peculiar alerta-me. A mensagem chegou na forma de imagem, trazendo largura ao pensamento, profundidade aos sentimentos, a dúbia tristeza perante a incapacidade de formular a pergunta certa, perante o espanto da novidade. Algumas palavras surgem num curto espaço de tempo e nelas se dividem as formalidades, escondendo a natureza mais profunda do que na realidade cada um pensa, ou sente. O significado do que motivou a acção e a interpretação da mesma, dificultam a franqueza das palavras, o medo de revelar as emoções, por precipitação do juízo de valor. Tão inesperado acontecimento, alterou o comum corrido das noites, e se transportou para o sonho, num fluido rio de fantasias, com direcção à foz para diluir os eus, na largura do mar e na ondulação das marés.
Apurar razões do acontecido, não faz sentido. Melhor será valorar o facto, pela oportunidade de rever nos traços da imagem, o lugar onde outrora dedos e lábios tocaram, juntando-lhes os sentimentos ainda latentes na memória. Ficar-se pelo prazer daqueles tempos em que tudo fazia sentido. As palavras e as pessoas marcam um momento, que nunca mais se repete. Apaga-se, ou renasce, em outro patamar fora do contexto do que lhe deu origem.


dc

domingo, 31 de maio de 2020

Erro de destinatário


A crueza da verdade chegou na mensagem. Engano no destinatário? Talvez. Um lapso de tempo, em que a memória nos atraiçoa e traz da escuridão à luz do dia, o verdadeiro sentir que o tempo escondia, debaixo das suas desculpas desarticuladas, confundindo as distâncias, vivendo num possível imaginário portal entre dois mundos. A frase era o reflexo do seu viver delirante, entre o experienciar da novidade e a rotina dos dias desse alguém que a habitava.
Ele, agora se apercebia, da razão daqueles sorrisos que nasciam e morriam de modo estranho, do olhar triste transcorrendo para além do espaço físico, como se dentro de si, de repente, a saudade batesse e lhe sufocasse o peito, afastando-a de quem a rodeava. Era evidente que procurava alongar-se no horizonte, para que nem o tacto, nem os cheiros traíssem a sua vontade de permanecer naquele lugar, mas mantendo o sentimento que lhe provocava a saudade. Como aparas sobejantes do limar das frases, ficavam os restos de um diálogo inacabado de palavras, cujo significado se perdia no labirinto das interrogações e perguntas que nunca chegaram a ser articuladas.
O tempo não se recupera, dar tempo não faz sentido. O apego é um sentimento doloroso, uma abnegação doentia do eu, em benefício, duma imitação barata de amor.  

dc

terça-feira, 19 de maio de 2020

Não me sujem a água


Eu sou pato não quero que me sujem a água, preciso dela para mergulhar o pescoço e depois coçar a plumagem. Quero a liberdade do rio, do lago, ou qualquer outro lugar onde exista um espelho de água, nela possa mergulhar e sentir as suas ondulações. Não me importa que o sol plante luz e sombra, conforme lhe ocorre, eu escolherei qual o momento de me passear. Os meus amigos patinham como eu, deixando um rasto de ondulação riscando a trajectória. Por vezes, quando cai uma folha junto de mim, que começa a navegar como um pequeno barco e deixo que ela vá, como eu, sulcando a própria vida e leve as "patices" que em mim, observou. Aqui neste pequeno ribeiro, onde agora me encontro, não existem reis nem governantes que me destinem rotas, aqui a minha natureza se revela, dentro duma outra que me envolve e me completa.
Há uma criança gargalhando algures tão feliz como eu, mexendo na água deliciando-se por sentir o desconhecido. Ela ainda não foi racionalizada, ainda é um céu infinito de intuição, não precisa descrever, ou explicar, por que razão a humidade, o frio da água e as ondulações, que as suas mãos provocam, a tornam feliz. Aquela criança está mais próxima de mim que dos seus, mas um dia vai-se racionalizar e esquecer a água como agora a sentiu. A gargalhada dela rompe o ar, os pássaros, e nós, começamos todos a falar ao mesmo tempo, quebrando o silêncio e o vazio envolvente. É um colectivo que quer falar, que quer comunicar, para que ela um dia sinta a diferença, entre o hoje sentido, e o futuro, em presente acontecendo.

dc